quarta-feira, 10 de julho de 2013

Nossa História

Caminhava uma caminhante. Errante. Sem direção alguma. Tinha os pés cansados e nas mãos um pedacinho de esperança. Os bolsos vazios de vinténs do mundo. O que podia lhe comprar com isso?
Mas o que almejava tanto, não existia no mundo moedas para pagar. Tinha buscado tanto. Debalde.
E mesmo assim caminhava. Como se uma força a impulsionasse. Um dia chegaria, a tal força dizia.
E pensando em repousar seus pés, sentou-se a beira de um riacho. Ali corriam águas claras e cristalinas, como lágrimas felizes de uma mulher ao rever seu amor.  Olhou para as pequenas ondas que desciam rápidas, ligeiras como se fugissem, e como se tivesse fugido do tempo por alguns segundos, do outro lado do riacho, surgia um homem cansado e belo, buscando ali matar sua sede. Com os mesmos olhos dela, olhos aqueles que também buscavam debalde aquela mesma coisa, aquela mesmo pulsar. E uma Força Maior o fez parar ali para beber da mesma fonte.
E foi ali, naquele instante, no mesmo rio em que repousavam e buscavam alento que reencontraram-se, reconheceram-se, re-sorriram-se, como há muito não sorriam pra ninguém. E o caminho de um encontrou o outro. E os pés passaram a caminhar juntos. As esperanças multiplicaram-se como flores da primavera. Os bolsos, ainda continuam vazios de vinténs do mundo, apenas o necessário para viver. Mas de que mais precisam? Aquilo que procuravam tanto, encontraram e seguiram juntos, na infinita estrada da evolução.

segunda-feira, 27 de maio de 2013

Bom dia

Não tenho roupa pra amanhã, eu nem tirei a maquiagem. Eu disse que ia dormir em casa, eu dormi sem querer só pra ficar com você.
Eu não sei cozinhar direito, nem laranja eu sei descascar em menos de dez minutos.
Eu não falo inglês como gostaria e tomo chá industrializado.
Eu preciso trabalhar amanhã cedo, eu não quero interromper seu sono.
Eu só quero que você durma bem e sorria pra mim quando acordar;
Eu podia ter levantado, colocado despertador, eu podia ter dormido menos.
Mas eu dormi por querer só pra ficar com você.

segunda-feira, 13 de maio de 2013

Semana

Eu tava caminhando na praia outro dia, fazia tanto tempo que eu não tinha tempo pra mim, sabe. Os amigos chamaram e eu fui. Sábado e domingo só, mas fez uma baita diferença. No domingo levantei cedo, fui caminhar na orla. Bem cedinho mesmo. Andei tanto que depois sentei pra ver os primeiros raios alaranjados do Sol, dançando como odaliscas encantadas e seus lenços, pintando com mãos habilidosas um dos quadros mais belos de composição da Mãe Natureza: o amanhecer.
Lembro-me exatamente do que pensei nesse dia. Pensei se um dia ia existir alguma coisa entre nós. E lembro-me de ter me espantado por pensar isso. Eu via você na multidão, você me sorria com os olhos e todas as vezes, depois desses encontros passava o dia pensando em você.
Caú, eu lembro de ter pensado em você como você tava naquele dia em que conversamos tanto. Você é uma menina linda, Caú e eu só queria entender porque o mundo fica mais colorido quando você está perto.
Esses dias de céu tão azul, pensei em passar na sua casa, pra gente dar uma volta no parque, comer alguma coisa em algum lugar. Qualquer coisa, Caú, porque eu queria te ver. Queria mesmo. Queria encontrar com você na rua, andando de fone de ouvido, cantarolando quase muda as suas canções preferidas, assim como eu te vi outro dia, mas não deu tempo, Caú. Eu tava correndo. Aliás, eu tô sempre correndo.
Mas você seria meu freio. Eu tenho vontade de viver a vida com mais calma quando eu penso em você. Tenho vontade de tomar meu café de manhã bem devagar, enquanto eu seguro sua mãozinha gelada pra aquecer. Eu sei que você tem as mãos geladas, outro dia você tava assoprando elas sem parar, sorriu e me disse brincando "Mão fria, coração quente".
Eu esquento suas mãos, Caú. Esquento teus pés, teu corpo, teu coração. Faço da tua vida um verão pra sempre, se você quiser. Mas se você gosta tanto de inverno assim, a gente pode viver esse inverno juntos e nada vai ser tão frio que eu não possa aquecer. No inverno, na primavera, outono, verão e nesse misto de estações que estamos vivendo.
Deixa eu entrar na sua vida, Caú. Deixa eu fazer parte dela. Deixa eu cuidar de você no domingo, te levar pra trabalhar na segunda, almoçar com você na terça, te mandar flores na quarta, levar você pra faculdade na quinta, dormir com você na sexta, cozinhar pra você no sábado e te amar todos os dias da semana, de segunda a segunda, até o fim de todos os meses e anos...

domingo, 12 de maio de 2013

Heresia

Surgiu a segunda-feira fria, eu tinha rezado um dia antes pra minha Santa Inês me proteger desse sentimento. Saí de casa respirando aquele ar frio. Tudo daria certo. Das colinas vastíssimas ao sol que surgia em tons alaranjados. Livra-me, Santa Inês, eu tenho medo desse coração que bate aqui. Então, entre as verdes folhagens eu o avistei. E meu coração se cortou em navalhas do frio e da incompreensão. Por que, Santa Inês? Por que, tu?
Fugi da minha heresia, passei rapidamente por ti, não me viste, nem me notaste e eu sumi entre os pomares do inverno.
Nunca pude olhar muito tempo nos olhos teus e não consigo conversar contigo fitando-te profundamente nos olhos. Eu tenho medo de gostar demais de olhar pra eles, de me perder na floresta verde que eles me sugerem e não querer nunca mais sai de lá.
Eu fugi de ti, tantas vezes eu fugi de ti.  Torturava-me ao furtar-me da tua companhia, porque tinha medo que olhos meus me denunciassem, de que tu percebeste, nos mínimos detalhes, no silêncio que as vezes se fazia entre nós, o bater descompassado do meu coração amedrontado.
É uma heresia, minha Santa Inês! Segura meu coração Contigo, não posso desejá-lo! Valei-me, Nosso Senhor! Eu não posso, Deus! Não é certo, eu pensava. E quando juntava as mãos em oração, via-te, sorrindo, aspirando em largos haustos o frio desses dias, no sorriso convidativo de esperança de dias porvindouros.
Eu procurava no teu olhar uma condenação, uma denuncia tua, um não qualquer. Mas nada. Então eu balançava a cabeça afastando estes pensamentos todos, valei-me Santa Inês! Que minha alma seja forte como eu tento ser!
Da última vez, me abraçaste de um jeito e eu tentei fugir dos teus braços. Porque eu queria ficar ali, queria voltar e pedir "abraça-me de novo", tantas vezes quanto necessárias. E afasta todos esses medos daqui. Mas eu não podia, eu não posso. E fugi dos teus braços como o diabo foge da cruz, porque lá no fundo, com essa fuga toda, ele só quer a redenção do amor do Cristo.
E todas essas suposições que me assolam ao dormir, quando rezo tanto, acordo pensando em ti. És a primeira face que pinta na minha mente quando mal abri os olhos. E te vi sorrindo mais uma vez pra mim.
Minha Santa Inês, apenas aguardo o Tribunal do Santo Ofício, trazendo minha condenação.
"Herege, herege!" eles me dirão. E eu fugiria mais uma vez se conseguisse, mas já não posso, reconheço meus pecados. Abro meu coração ao Nosso Senhor, que Ele me perdoe cem vezes por esses pensamentos. Herege, sim. Esta sou eu. Herege por ti, condenada pela Inquisição das circunstâncias, queimando na fogueira desse amor.


sexta-feira, 19 de abril de 2013

Ou me engole ou me cospe. Mastigar não vale!

Meu rei perdeu a coroa. Deixou a princesa trancada na torre. " És minha mas te busco quando quero". A única coisa que ele não sabia é que o coração é a chave de todas as portas.
Amarrei os lençóis e desci. Presa aqui? Por ti? Não fico não!
Não se prende o amor nas gaiolas da indecisão. Amor é pássaro livre. E eu nasci com um belo par de asas.
Enquanto tu te preocupas com as finanças do teu reino, eu vou dar risada e dançar Congada com os índios e índias, mamelucos e todos os povos. O amor do mundo está dentro de nós, no bailar das saias que me dizem "não murches, minha flor, o mundo é vasto e mais vasto ainda é teu coração".
Não quero me contentar com o miserê do teu amor ralo. Mais ralo que o mingau que eu tentei fazer outro dia. Confiança é a maizena das relações. Doação é o açúcar e você quer ser amargo, mas não vai me amargar junto.
O amor do mundo é maior do que tua proposta, que me retém no teu egoísmo e na tua vontade. Não pensou nem um instantinho se eu já gostava de ti bastante mesmo. Não tem problema. O amor do mundo sai pelos poros de quem sorri tranquilo. Os teus poros estão entupidos de medo.
Medo tenho eu também. Quem é que não tem? Mas eu deixei o medo pra te seguir. Porque quando a gente tem medo a gente segura na mão do outro e vai junto, andando pelo escuro. Se eu caio, tu me segura. Eu te seguro também se tropeçares. No mundo nada é certo, só o amor.
"Se tu me quiseres tem que ser assim". Pois não te quero assim, as metades, aos pouquinhos. Ou vens inteiro, ou te vais de vez. Não me alimento de migalhas. Eu como inteiro, raspo o prato e lambo os beiços. De miserê já me basta a dieta da nutricionista. Tira-me o carboidrato, mas não tira-me a esperança do amor porvindouro. E tu me tiraste tudo que reguei. Plantamos juntos uma semente, quando virou flor eu fui colhê-la, tu me deixaste porque teve medo dos espinhos.
Eu mereço mais do que isto tudo. Isto tudo não. Isto pouco. Não te apressei, como se apressa um almoço. Tava esperando o teu ponto certo. Assim como a gente deixa a massa do pão descansar e crescer sozinha. Eu esperava teu tempo porque te respeitava. Porque não te pedi nada, mas tu me disse pra eu me fechar em balanço. Balançamos juntos num barco sem remo. A gente nada pra não se afogar. Mas morreste na praia. Enquanto eu boiava feliz, apreciando a beleza do céu.
Quis te salvar, chamei-te pra perto. Não me respondeste.
Deste miserê, não quero mais nada.
Dá-me tudo. Ou dá-me nada.
Não sou pão que tu esfarela assim.
Ou me engole ou me cospe. Mastigar não vale.

quarta-feira, 17 de abril de 2013

Lembranças da sala vazia

Passou os olhos pela sala. Nada de móveis, nada de televisão, nada de nada. A sala, antes o refúgio preferido, era agora apenas um cômodo vazio, cheio de caixas e lembranças inapagadas.
Era melhor sair de lá mesmo, o psicanalista tinha razão. "Conviver com o luto de uma pessoa viva só está prejudicando você". O psicanalista era a salvação da lavoura, apesar de muitas vezes detestá-lo, tinha um apego imenso aquela criatura nada simpática e que repetia sempre "você não pode depender de mim pra tudo".
Fazia oito meses que estava fazendo psicanalise. A ideia veio de um amigo que não suportava mais vê-lo destruído sentimentalmente pelos cantos. Dois meses de chororô e ele decidiu seguir o conselho do amigo. Estava surtindo efeito.
Com o olhar de quem enxerga lembranças, recordou-se de tudo o que viveram naquele apartamento simpático nas proximidades do Klabin. Parecia que o riso dela ecoava ainda mais alto com tudo aquilo vazio. Lembrou dela de camisola de ursinho, cabelo preso num coque alto e os óculos de lentes grande na mão. Andando sempre procurando algo. Ela perdia tudo em todos os lugares. Revirava o mundo, depois achava do nada. Era um hábito. Todo dia ela perdia alguma coisa. 
Ela gostava de cozinhar as receitas da avó, que era natureba porque tinha feito parte do movimento hippie. Ir a feira era a diversão dela, mas as feiras de São Paulo não são tão calorosas quanto a da minha cidade, ela sempre dizia.
Toda sexta era dia de alguma coisa ao funghi, ou panquecas integrais sem leite, apesar dela não dispensar um chocolate quente. Lembrou-se de como ela se jogava no sofá, com os pés pra cima, dizendo que não tinha nascido pra andar de salto, sempre que voltavam de uma festa.
Lembrou-se do choro e de quando ele ganhou espaço na rotina. Das vezes que ela saia do banho e ele sabia que ela tinha chorado. Ele fazia de conta que não via, sabia que estava errado. Trabalhava demais sem muito resultado. Fazia escalas que pareciam infinitas. Fim de mês era um perrengue.  E a frase que ela mais dizia era, " Você prometeu que a gente ia ficar um ano aqui só, e que depois a gente ia se mudar pro interior, lembra? Eu não vou sobreviver muito tempo aqui, esse lugar não é pra mim".
E não sobreviveu mesmo. Flores raras como ela murcham com o excesso de fumaça e a ausência de carinho, de calor humano, de amor. Ela reclamava da falta de atenção dele e ele levantava o tom de voz dizendo que ela não dava espaço pra ele, que ele se sentia pressionado.
Até que um dia ele chegou, ela estava sentada na mesa da cozinha, uma mesa improvisada, com uma caneca de chá de canela. Os olhos vermelhíssimos e a voz dura. "Senta aqui".
E aquela foi a última conversa que tiveram. Ela disse que ia embora, que ia morar na casa da avó de novo, que São Paulo ia envenená-la de decepção e a frieza dele ia terminar de matá-la. Queria uma vida melhor, mais amor, mais carinho, presença, queria se sentir importante de fato, se sentia uma intrusa na vida dele de ganhar dinheiro a qualquer custo. Queria trabalhar no que gostava, o pequeno museu da cidade e as aulas de História iam ajudar. Aquele colégio no Ipiranga não era sua praia. Queria a tranquilidade de um amor companheiro, os desafios da lida diária, não brigas e gelos consecutivos sob o mesmo teto.
Quando percebeu, estava chorando. Lágrimas abundantes e doloridas. Nada doía mais que a ausência dela. Nada doía mais saber que ela o amara, que lutara com todas as forças pra trazê-lo pra perto, pra lhe mostrar o valor das coisas simples da vida. Ele a teve em seus braços, tinha o coração dela nas mãos. Mas hoje, tinha só um eco no peito, um vazio no apartamento e as lembranças por toda parte. Chamou o elevador, enfiou as caixas nele. Apertou o "T" e desceu chorando. A vida ia ser muito mais difícil sem ela. 



segunda-feira, 8 de abril de 2013

Ninho

Lembrei do aconchego dos teus braços e senti frio. Frio daqueles que a gente sente quando tem saudade. Me encaixo perfeitamente nesses grandes braços que você tem. Eu caibo no seu peito como ninguém.
Queria olhar pra você e poder dizer tudo. Queria olhar pra você e poder entender tudo. 
Foi naquele dia que eu vi o colar de diamantes que existe no céu da noite. Vi estrelas brilhando como se nunca as tivesse visto antes. Eram cada vez mais luminosas e grandes. Pareciam mesmo um belo colar de pedras preciosas, envolvendo o pescoço dessa dama serena e secreta que é a noite. Imaginei que elas fossem descer do céu, pequenas pedras reluzentes e você as entregaria a mim. 
Fez-se um brilho imenso, um farol despontando no céu, uma lanterna, um holofote para nos dois. Uma lua clara esplêndida iluminava nossas cabeças e banhava-nos de raios cor de prata, suaves como o vento.
Disse pra você que estava com frio, mas era só mais uma desculpa pra você me abraçar de novo. Porque quando você me abraça mesmo, eu consigo entender. Não preciso falar, não preciso ouvir. Parece que entendo tudo o que há entre nós nesse abraço, nos seus braços, nesse embaraço que desembaraçamos toda vez que a gente se olha e sorri junto.
Tenho saudade desses finais de semana. Eles são escassos pra minha tamanha vontade de me aninhar em você, feito pássaro manso que busca refúgio em um ninho.
Você me agita, me derrota, me vence quando eu pego em armas, porque estou na defensiva. Não há ataque quando se quer paz, calma e coração. 
Eu sou seu ninho também. Você só precisava entender isso e repousar seu coração em mim. Porque quando você se aninha no meu colo, o mundo inteiro dorme em paz.

"Você tem uma nova mensagem"

" Malu,
Não sei o que pensar direito quando penso em você. E se não sei o que pensar, imagine o que escrever. Mas eu queria te contar, porque tudo aqui me lembra você e cada lugar que eu vou fico pensando o que você diria, que história me contaria, como você seguraria minhas mãos de luvas nesse frio horrível e que fica ainda mais gelado sem você por perto. 
Um mês passa rápido, eu penso. E passa mesmo, já são três meses com você, né? Passou rápido mesmo. Não somos bons de datas, mas eu sei que já fazemos três meses juntos. Então, um mês vai passar rápido. Otimismo, lembra? Eu só tenho mais quinze dias aqui e desde que cheguei tenho pensado em você todos os dias. Não que eu já não pensasse antes, mas parece que penso mais em você a cada dia. E parece que você ganha cores novas sob as minhas perspectivas. Dá pra entender?
Foi como aquele dia que você saiu de batom vermelho e eu disse que não gostava muito. Mas depois eu via como qualquer cor de batom ficaria linda na sua pele que mais parece um lençol de seda, cetim, qualquer um desses tecidos finos e macios, que se parecem com a sua pele.
Eu fui visitar um lugar, me falaram daquele cara que você me contou outro dia, Raspuntin. E eu fui perguntar pro guia sobre esse cara e disse "Rumpelstiltskin" e o guia caiu na risada. E eu imagino você lendo isso agora, você deve estar rindo, colocando a mão direita na testa, balançando a cabeça em sinal negativo, pensando que eu sou um idiota e sorrindo esse sorriso mais lindo que eu nunca vi um tão lindo na vida.
Fico pensando como está a sua correria entre aulas de História no colégio novo e suas pesquisas sobre a revoluções burguesas, organicismo e tantas outras coisas que eu penso como alguém pode ter tanta memória pra lembrar de tudo isso.
Eu sentei na varanda do hotel, ela é de vidro e climatizada pra proteger a gente do frio. Lá fora a neve caía silenciosa e eu via como não fazia parte de nada disso. Pensava a cada instante nessa imensidão branca e civilizada que o que eu mais queria mesmo era ter você perto de mim. De como você me acalma, mesmo longe, de como qualquer sms seu parece vir como um chá de camomila, acalmar e adoçar meus dias. Sinto falta da sensação de que posso pegar o carro e a qualquer momento chegar na sua cidade. Esses quilômetros e mares que nos separam nesse mês estão retorcendo minhas entranhas e virando meu coração no avesso de saudade de você.
É, Malu, saudade dessas que dói. Como deve ter doído em você o dia que eu disse que você vivia demais na teoria, que precisava ser mais prática. Você me confunde, Malu, porque eu nunca conheci alguém como você. Das mulheres que passaram pela minha vida ou elas eram excessivamente workaholics, como eu, ou eram mimadas e acomodadas. Nunca conheci ninguém que prezasse tanto minha massa cinzenta e não meu porte atlético e minha condição de empresário.
Nunca conheci alguém como você, que consegue ultrapassar as barreiras das letras escritas nos livros, me transporta no tempo, me leva pra conhecer Roma, Pompeia, França, sem me tirar do sofá da sala. Você me apresentou um mundo que eu não conhecia. Sempre foi e ainda é difícil pra mim entender como que alguém que "dá aulas e só estuda" poderia realizar coisas práticas.
Mas hoje, refletindo um pouco mais sobre você, o mundo e seu papel nele, Malu, nossa, eu fui um imbecil. As mudanças que você faz são muito significativas porque são mudanças profundas, sabe...
Você deve estar espantada lendo isso, mas acho que hoje eu entendo melhor você, porque hoje eu entendo o que eu sinto em relação a você. Dessa coisarada toda que eu escrevi, só queria te dizer quando eu chegar, quero você mais perto de mim, quero levar você pra almoçar na casa da minha avó, quero ir na sua casa, comer amoras do pé como você diz que faz aos domingos, quero brincar com seus cachorros e dormir no sofá da sua sala. Malu, eu só quero você mais perto de mim, como você diz "Mente, alma e coração, juntos". Pode ser assim? Diz que sim? Eu só quero você mais perto de mim, Malu... 
Tô com saudades... Muita...
Um beijo, Túlio..."

terça-feira, 2 de abril de 2013

É, menina...

Ela babou no meu braço e me acordou no meio da noite com um cutucão, resmungou que eu tava roncando, me abraçou e dormiu de novo.
Meteu os pés gelados no meio dos meus. "Me esquenta?". E como é que eu vou negar um pedido vindo dos teus olhos, menina?
Assim como eu fiquei pensativo quando você me olhou com aqueles olhos tristes, que seguram as lágrimas mordendo a ponta da língua e me disse " você entende?".
Não sei se eu entendo, não sei se eu entendo você e toda essa coisa mágica que veio junto com o balançar dos teus cabelos claros.
Não sei se eu entendo esse seu jeito místico de ver as coisas, mas de repente eu me pego flutuando na sua fala macia, me vejo batalhando na sua guerrilha, não sei nem que horas eu decidi que queria pegar em armas.
Mas depois eu hesito um pouco, tenho medo de que um dia tudo dê errado e eu me afogue no pólen das flores do seu jardim, morra de rinite, ou que corte meu pé nas conchas do teu mar, antes meu porto seguro.
A verdade é que tenho medo do que já acontece. Revogo e prorrogo os prazos do meu coração que já foi entregue pra você numa bandeja o dia que te conheci.
"Não deixa ela escapar". Essa frase ecoa todos os momentos em que penso que por um segundo, dei uma brecha pra você fugir de mim. Seja com meu jeito metódico de ser, com minhas expressões duras, com minhas cobranças que vem fora de hora e eu sei, te ferem um bocado.
Mas contrariando tudo que eu imaginava, você fica.
Você resiste as intempéries do meu comportamento austero, das minhas rogativas incessantes, porque no fundo eu só queria me certificar que é você mesmo.
E você surge de novo, no meio das chamas das minhas dúvidas, vencendo a fumaça do meu medo, resistindo heroica e lindamente todas essas coisas que afastaram tantos sorrisos de mim. Então eu paro e penso se talvez não foi pra encontrar você que vivi a vida toda. Se num instante do seu olhar, não fazem valer a pena os meses em que me arrastei sem entender direito o que eu procurava numa mulher.
Me sinto envergonhado quando vejo você me enfrentar por alguma babaquice que cometi. Porque a última coisa que eu queria ser era babaca com você. E o dia que você apontou o dedo na minha cara e disse com todas as letras que não era as filhinhas de papai com as quais eu estava acostumado, aquilo foi um golpe duro demais pra mim. E por mais que eu soubesse desde o início que não, você não era uma menininha mimada, eu fui rude em não ver os mergulhos silenciosos e profundos da sua própria história na calada da noite, sem agitação ou testemunha. Enquanto você chorava baixinho naquele dia, eu senti o medo maior tomar conta de mim.
Não quero perder você, minha menina.
Nem tua doçura, antídoto pros meus males diários que me cura aos finais de semana, com seu jeito macio de ver a vida, leve como uma borboleta, num campo de rosas. Vivendo pra ser feliz.
Fica, fica mesmo. Fica porque eu preciso do seus olhos mansos, das tuas mãos calmas, dos teus dedos firmes passeando no meu pescoço dizendo que vai tirar toda tensão num passe de mágica.
Mágica? Não tem nada de mágico nisso.
Porque quando eu olhei pra você eu pensei em amor. E foi isso que você me respondeu quando me olhou.
É, menina. É amor...

quinta-feira, 28 de março de 2013

Sobre enroladores, metades e a caretice saudável


"Você precisa ter calma", "Você precisa ser paciente", "Você vai assustar o moço assim!".
Qual de nós nunca ouviu essa frase quando está em vias de começar um relacionamento que atire o primeiro bojo!
São conselhos de toda ordem que nos vem de todos os lados para que sejamos o mais "moças", "damas" e polidas possível. Conselhos sempre de quem nos quer bem, certo? Outros nem tanto. Mas eles vem até do motorista do ônibus, que pede que você vá com calma, coisa e tal.
Ok, Brasil. Mas vamos desmistificar um pouco isso?
Porque existe uma sutil diferença entre ter pressa de tudo e querer entender a relação na qual se investe. Sim, e digo investimento porque investimos tempo, dedicação, roupas, salão de beleza e paciência. E haja paciência!
 Eu sei que vai parecer título daqueles manuais prontos sobre "mulheres poderosas conseguem tudo o que querem", mas eu preciso dizer uma coisa: Homens, mulheres inteligentes sabem quando estão sendo enroladas.
 Porque um homem quando enrola uma mulher dá todos os sinais possíveis e imagináveis de que está fazendo isso. A começar pelas desculpas esfarrapadas justificando a ausência dele. Quando ele está te enrolando, minha amiga, até a arrancar o carrapato do cachorro vira mais urgente do que você. E naquela abundância toda, ele vira pobre em um instante. Não tenho dinheiro nem pro passe do busão. E seja compreensiva, porque ele está com saudades, claro, mas nada urgente, a gente pode esperar não é mesmo? Temos a vida toda pra esperar o paspalhão decidir se vai ficar com a gente ou com as outras 350 nega que ele enrola consecutivamente. O advento das redes sociais não nega quando estamos sendo enroladas, caras amigas! Só não vê quem não quer...
E o que mais me indigna é aquela maldita frase que o enrolador usa "Nós estamos nos conhecendo!".
Frase essa muito capciosa. Porque realmente, quando estamos começando a investir num relacionamento, as vezes vamos com mais calma, especialmente se já fomos tragicomicamente traumatizados por experiências pretéritas, sim? Então vamos devagar, caminhando, cantando e seguindo a canção.
Mas nesse meio tempo, você, mulher esperta e altiva, percebe se realmente, o interesse é conhecer melhor, ou simplesmente te colocar no banco de reservas e quando a boa vontade do ser em questão surgir, ele te chama pro ataque.
Francamente, muito me espanta (e não sei porque me espanto, né) que os marmanjos de hoje em dia ainda se utilizem dessa prática e que certas mulheres desavisadas ainda caiam nesse conto pra lá de manjado!
O pior de tudo é você perceber que está sendo enrolada e se permitir ser enrolada por mais tempo. Se lhe convém a enrolação, minha amiga, vá em frente e seja feliz. Mas nunca espere de um enrolador mais do que desculpas esfarrapadas, vontades mínimas e desejos efêmeros. Acende e apaga assim como fósforo. Chama fraca e nada duradoura.
Eu sou dessas ditas "caretonas" que se percebe que está sendo enrolada, pula fora. E acho uma caretice muito salutar pra minha saúde emocional. A gente sabe onde o calo aperta e não quero correr o risco de passar anos da minha vida, assim como a gente vê frequentemente, num barquinho que não sai do lugar. A não ser que eu esteja de comum acordo com a enrolação, não sou do tipo que começa um relacionamento pra não dar em nada. E também não tô falando que tô procurando um marido ou um pai pros meus filhos. Há um grande equívoco em pensar isso de nós que não apreciamos o status de relacionamento "enrolado". A questão é que prefiro gastar energia com outras coisas. A gente fica atrelada, com o coração meio preso, meio solto, com meia vontade disso ou daquilo. Tudo muito morno, nada muito concreto. De metades já me bastam aquelas do pãozinho que a nutricionista mandou comer de manhã. Meio pãozinho eu aceito, meio amor? Não, muito obrigada.
E como eu disse pra uma amiga sobre um enrolador "você é gato, mas eu não sou novelo".

segunda-feira, 25 de março de 2013

Talvez você ainda não saiba...

Olho bem quando vocês passam. Fico observando os detalhes do sorriso dela nas fotos de vocês dois. É, cara, ela tá gostando mesmo de você.
E só quem teve o prazer imenso de ser o sujeito na oração dessa mulher sabe do que eu estou falando. Você deve estar sabendo agora, mas talvez não saiba de tudo.
Você não sabe, por exemplo, a dor diária que é conviver com a ausência dela. É como aquele caco de vidro bem pequeno que entra no seu pé e você não consegue tirar. Ele vai doendo, inflamando. Tem dia que parece que a gente esquece que ele está lá. Mas tem dias que ele sangra e é uma dor horrível, cara. 
Talvez você não tenha percebido que ela é a mulher da sua vida. Porque eu não percebi enquanto a gente tava junto. E hoje, quando eu olho pra vocês, sinto um turbilhão de sentimentos. Um misto de pesar e de resignação. Talvez uma certa alegria porque tem alguém que cuide dela. Mas um vazio fundo e dolorido, uma sensação de quem perdeu o último avião que levaria até sua terra de origem, e que depois dessa partida, as linhas áreas fizeram uma greve e você não sabe quando vai poder voar novamente de volta pra casa.
É como acordar bêbado numa casa que não é a sua, não conhecer ninguém e não saber como você foi parar ali.
Talvez você ainda não saiba, mas mulheres como ela não ficam muito tempo sozinhas se não quiserem. Mas ficam muito bem sozinhas quando querem também. Mas saiba que se você fizer pouco dos sentimentos dela, vai ter sempre um espertão e bem esperto mesmo, que vai saber dar valor pra ela. Mulheres especiais a gente reconhece de longe. 
Talvez você não saiba também, mas por mais apaixonada que ela esteja, e ela está, porque dá pra ver naquele sorriso maldito de lindo que só ela tem que você é o cara pra ela, dá pra ver nos olhos imensos de desenho animado que ela tem que você é a resposta pras perguntas dela, dá pra ler em cada frase que ela escreve, porque depois de algum bom tempo lendo cada coisinha que ela escreve, você passa a compreender o labirinto suave e a montanha russa encantada que é o coração dela. Mas como eu ia dizendo, por mais apaixonada que ela esteja, ela vai sobreviver a você.
Porque ela é forte. Disse Freud que as pessoas que se sentem seguras de serem amadas ficam mais fortes. E ela é forte não porque você pode amá-la, porque você pode deixar de amá-la também, mas ela é forte porque ela se ama. Ela sabe o valor que tem. E sabe que se ela não morreu de amor ainda, não morre mais. Porque ela é uma Fênix, cara. Ela pode até chorar, sofrer, virar cinzas, mas depois cara, ela ressurge ainda mais linda, brilhante, com toda força do mundo pra encarar o que a vida lhe trouxer.
Ela é uma mulher como poucas, e talvez você ainda não saiba disso.
Talvez você ainda não consiga perceber o que ela quer dizer quando ela entrelaça os dedos no próprio cabelo e leva até o nariz, talvez você ainda não saiba que ela pensa em você quando vai dormir e quando acorda. Talvez você não saiba o tamanho do tesouro que tem no coração dela, e cara, se você perceber, segure! Faça ela se sentir amada, não seja egoísta, egocêntrico, não pense só no seu prazer, no que você tem no meio das pernas, não pense no seu maldito orgulho e não dê ouvidos ao medo imbecil de se entregar.
Esqueça as convenções, ela não é um boneca de porcelana, muito embora pareça, e nem uma boneca inflável. Ela não é uma boneca, nem uma super heroína que vai resolver todos os seus problemas, cara. Ela é uma mulher. Linda, filhadaputamente linda. Que fica mais linda ainda quando está apaixonada. E ela está cara, mas talvez você ainda não tenha percebido isso.


segunda-feira, 18 de março de 2013

Conselho para Clarice

"Clarice, tem uma série de coisas que eu gostaria de lhe escrever nesse dia frio. Lembro de como você se sentia absolutamente confortada nessa estação, com dias frios, o nariz vermelho e uma calma aparente. Você dizia que o frio protegia seu coração. O verão nos expõe demais, Clarice. 
Fico pensando como lhe dizer todas essas coisas, queria dizer que tudo vai dar certo, que será dessa vez, que vamos comer bolo juntas, comprar guardanapos e rir tanto depois. Mas esses inícios, essas expectativas, oh, Clarice, isso fere tanto, não sabemos nunca como agir.
Não queria lhe ditar regras, mas como conheço seu espírito, seus olhos claros e as olheiras que você disfarça com base, gostaria de lhe dizer algumas coisas. Não queira me matar, leia até o fim:
Seja paciente. Seja agradável. Seja gentil. Seja compreensiva.
Esteja bonita. Esteja linda. Esteja disposta. 
Seja inteligente, mas não muito. 
Seja inocente, mas nem tanto.
Segure as pontas, não chore.
Segura o choro, não desaponte.
Segura o medo, não fuja.
Segure a fuga, não tema.
Feche a boca, coma menos.
Perca a barriga, perca o pudor, mas nem tanto.
Nem tão magra, nem tão sem vergonha.
Não escreva, guarde as palavras.
Não diga tudo, diga só o que for preciso.
Não precise, não peça, não reclame.
Não cobre, não cobre e não cobre.
Se cubra, se proteja, se entregue.
Dê amor, mas não dê o coração.
Dê, amor e o coração.
E quando tudo isso parecer muito contraditório
E quando nada disso mais fizer sentido pra você
Esqueça tudo isso, esqueça todas as regras
Esqueça todos os manuais que dizem como devemos ser
Como devemos agir, em quanto tempo devemos dizer,
dar, amar, falar, sorrir, segurar, soltar, compreender, assumir.
Esqueça tudo, não seja nada disso
Seja você mesma e seja o que Deus quiser.
Te amo, Mana."


sexta-feira, 15 de março de 2013

Por um mundo onde se corra menos atrás e mais ao lado!

"Tô cansada de ficar correndo atrás".
Certamente você já ouviu ou falou essa frase pelo menos algumas vezes na sua vida, minha amiga, e é verdade, tem uma hora que a gente cansa. Cansa mesmo.Cansa de correr atrás. Cansa, porque correr atrás não é o caminho. Tem uma hora que não dá mais pra correr atrás. Chega uma hora que a gente precisa aprender a correr ao lado. Essa história de correr atrás deve ficar no passado. Redundante assim mesmo, mas é verdade.
E um passo importante é olhar e perceber o ritmo dessa pessoa que você quer que corra com você nessa maratona. Porque se você percebe que ela quer sempre estar na sua frente, que você tá sempre ali, correndo, correndo e nunca alcança, bom, a constatação que a coisa tá errada não precisa vir num pódium com um troféu dizendo "você está fazendo isso errado" nem com um "a gente se fala" como prêmio de consolação, né?
Correr atrás não é o caminho. E olha que tô começando a perceber isso depois de gastar muitos sapatos, tênis de corrida, hawaianas e salto alto nessa minha vida com quem não tava me esperando pra essa prova!
Sabe, parece discurso pronto, manjado, clichê, mas correr atrás só vai fazer você se cansar. Cansar até do que não deveria, como do amor, das relações e da paixão. Sabe, quem quer a nossa companhia, espera a gente pra correr junto.
Junto. Essa é a palavra.
Chega uma certa altura da vida, quando a disposição para amores bandidos, amores fast-food, amores líquidos, cai drasticamente, daí gente começa a pensar que não tá mais naquela forma de ficar correndo atrás de alguém desse jeito, que a gente não quer um relacionamento competitivo onde se aposta o orgulho, o ego e a vaidade. Porque não dá mais pra gente viver num mundo onde as pessoas estão empurrando umas as outras, passando por cima de tudo pra alcançar um outro alguém, que na maioria das vezes, tá indo na direção totalmente oposta da gente. Tô cansada de ver um monte de zumbi sedento de amor, correndo atrás de idealizações mesquinhas e fúteis  buscando lá na frente algo que se um dia vier a alcançar, vai pensar "nossa, era isso que eu queria tanto?!"
Não que a gente vá sentar e esperar o príncipe aparecer. Mesmo porque a gente já tá cansada de saber que esse dia não vai chegar! E não tô aqui pra fazer apologia daquela filosofia fútil de "Homens, vocês que tem que correr atrás!". Não, não é isso. Mesmo porque não é mais pra correr atrás. É pra correr ao lado, juntos.
Chega um momento que o coração pede, as pernas falham nessa busca inalcançável pelas idealizações que fizemos e a gente passa a procurar um certo alguém que queira correr ao nosso lado, que queira correr junto. Faz muito mais sentido.
É claro que no começo, até a gente estabilizar o ritmo dessa corrida, um pode acelerar mais enquanto o outro pode parecer mais lento. Mas se for pra correr junto, uma hora a gente vai se acompanhar nos passos, vai conciliar o ritmo, vai compreender que nessa pista tem uma porção de obstáculos, buracos, pedras, pessoas, mas se a gente quiser correr junto mesmo, vamos conseguir ultrapassar essas barreiras, vamos ajudar se o outro tropeçar e porventura, se ele cair, a gente para, cura as feridas e continua. Mas junto. Porque esse é o objetivo.
É chegar junto em algum lugar. Não importa o lugar, mas que estejamos juntos.
Por isso olhe bem pra pessoa que tá com você, sabe. Ele tá aí, correndo do seu lado, ou tá lá frente, tentando alcançar algo dela e você aí, se matando pra alcançá-la? Olhe bem pra onde você quer ir, onde quer chegar, você tá correndo tanto por que mesmo?
Deixo aqui o meu pedido sincero, meu apelo aos corações cansados dessa maratona falsa de prêmio medíocre e ilusório. Não dá mais pra viver assim!
Por um mundo onde se corra menos atrás e mais ao lado! E tenho dito!

terça-feira, 12 de março de 2013

Grampos, shampoo de camomila e o medo

Ela deixou três grampos na pia do meu banheiro. Um shampoo de camomila aberto no box, fios de cabelo dela por toda parte e um vazio estranho que não tinha sentido antes.
O cheiro do perfume dela ficou no meu lençol, naquela minha blusa branca que ela vestiu pra dormir e no meu nariz. Parece que não passa. Volta e meia sinto o cheiro dela.
O eco da risada dela tá presente aqui por esses dias. Nunca pensei que uma risada fosse deixar tanto eco e ao mesmo tempo, tanto vazio aqui dentro de casa e dentro de mim.
Ela se meteu a fazer rabanadas de café da manhã e quase queimou tudo. Eu comi rindo e falando que era melhor ela aprender a cozinhar senão nada feito. Então aquele sorriso imenso foi desmanchando e ela olhou pra baixo. Achei que era brincadeira dela, sorri e pedi pra ela olhar pra mim. Ela levantou aqueles grandes olhos hipnóticos que só ela tem e eles tinham um brilho triste. "Juro que um dia eu acerto", disse ainda sem graça pela sua tentativa frustrada de me agradar. Puxei ela pro meu colo, soltei os cabelos claros daquele coquinho que ela insistia em fazer sem nada que o prendesse, olhei bem e disse.
- Eu vou saber esperar.
Diversos pensamentos me tomam quando penso nela. Ela me dá um medo que só. Olha pra mim e devora minha alma com o olhar. E se eu me perder pra sempre nesse olhar? Tento me conter as vezes, mas o sorriso que emana de mim quando ela tá distraída, olhando pro nada ou cantarolando baixinho e nem percebe que eu tô olhando pra ela, isso é uma das coisas que eu não consigo disfarçar.
Fez uma semana que não a vejo, mas a presença dela aqui é algo real demais.
Sinto saudades de ouvir ela contando de todas as coisas que já viu. De como ela parece resgatar imagens, sons e memórias e depois guardá-las numa caixa segura, porque a vida sempre continua, ela disse. Sinto falta daquele jeito que ela me pede pra deitar mais perto, ou quando pergunta se meu braço tá doendo porque ela tá deitada nele. Da concentração que ela passa delineador ou rímel, aprendi o nome dos dois, mas não sei qual é qual. Ela parece uma artista, minha jovem menina Monet enquanto se pinta. Segura aquele pincel de ponta muito fina e passa bem rente ao cílios  Minha Cleópatra, eu disse, ela sorriu e disse que eu era Marco Antônio, mas que queria um final feliz.
Volta e meia ela cheira meu pescoço e mesmo quando acho que meu perfume já saiu, ela continua ali. Nariz na minha pele, me causa uma porção de arrepios. Daí ela me morde e solta uma gargalhada farta, a mesma gargalhada que ela dá quando me belisca com o pé. "Nem dói, vai", ela disse rindo da última vez que eu reclamei dos "peliscos" como ela diz.
Fico pensando em todas essas coisas, ainda consigo ouvir ela pedindo pra eu acender a luz do corredor.  Fecho os olhos e vejo ela dormindo serena. Ela abriu os olhos devagar e ficou me olhando, sorrindo sem mostrar os dentes. Fechou os olhos com calma e voltou a dormir. Continuava sorrindo. Senti um medo estranho de repente. Medo maior do que esse de me entregar de vez. Medo maior do que ter minha vida invadida por ela. Foi um medo dolorido, desses que dói bem no fundo quando a gente pensa nele. E percebi que tenho medo de ficar sem ela. Mais do que todos os medos bobos, esse me pareceu bem real.
Me revirei algumas vezes ainda, quase não dormi direito.
Acordei com aquela sensação de vazio. Na cozinha não tinha rabanada, no banheiro, só os grampos e o shampoo. E no meu coração, a presença dela.
Será que vai demorar muito pra ela voltar?

segunda-feira, 11 de março de 2013

Mais bonito

Queria saber quais os processos, quais as sinapses, ligações neurais e compostos químicos que fazem com que cada vez que eu te olhe, te ache cada vez mais bonito.
Você já era bonito quando te vi a primeira vez. Claro, impossível não perceber que você já era bonito. Foi uma das primeiras coisas que vi quando no auge da minha miopia, apertei os olhos de longe pra te ver melhor. E depois, enquanto eu erguia um pouco minha cabeça pra conversar olhando bem nos seus olhos, porque você é bem mais alto que eu, numa tentativa de ver o que era ou quem era você, percebia mesmo que você era bonito.
No dia seguinte você continuou bonito daquele jeito. Não mudou muita coisa até a hora que você olhou pra mim e disse seu primeiro "linda" de sucessivos "linda" que ainda viriam.
No último dia daquele "três dias antes", como disse Nando Reis, você já estava mais bonito.
Então depois daquelas semanas, quando você sorria com seu olhar cansado pra mim no carro, já era absurdamente mais bonito do que a primeira vez.
E nesse último segundo do "Fica com Deus", enquanto as pessoas sentadas esperavam a partida, enquanto a gente também fazia parte desse contexto de idas e vindas, eu olhei pra você e nossa, cara, você é lindo.
Disse isso pra você, talvez não com essas palavras...
Fico pensando no que acontece dentro de mim quando isso acontece. Fico pensando como o coração bate, qual a velocidade do sangue nas minhas veias, como se dilata ou se contrai minha pupila quando olho pra você e você está ainda mais bonito.
Talvez seja um paradoxo entre as reações químicas e físicas, psicológicas e emocionais. Talvez seja a sua barba. Talvez seja alguma coisa que cresce em você, que cresce em mim. Talvez sejamos o espelho.
Talvez a cada dia que passe você me deixe ver um pouco mais de você. Talvez a cada dia que passa você se permita despir um pouco mais da armadura que você veste e que estava tão intacta quando disse a primeira vez que "a noite era uma criança". E penso que seria impossível você ser tão bonito como é hoje naquele dia, porque essa beleza crescente é um processo que eu ainda não sei explicar.
Diferente de algumas pessoas que pareciam tão bonitas e com o tempo foram ficando absolutamente feias. Isso já aconteceu com você?
Não que elas tenham se deformado, elas são as mesmas. Mas pensando bem, quando o sentimento deforma, parece mesmo que tudo transforma junto.
Sentimento. Talvez seja isso.
Fico pensando, pensando... Daí eu paro. Talvez eu já saiba, talvez já saibamos. Talvez você precise ficar ainda mais bonito, mas num segundo penso de novo, será que isso é possível?
E a resposta vem, quando sem querer me pego olhando pra você num instante e penso "você ficou ainda mais bonito".

segunda-feira, 4 de março de 2013

O pombo

Eu acordei sem poder abrir os olhos direito. Fiquei num coma mental forjado por mim mesmo pra entender o que estava acontecendo. Daí eu abri os meus olhos e vi que estava na casa do meu amigo. Mesmo assim forcei a memória umas três vezes pra me recordar de como tinha parado ali. Mas na quarta vez, foi como se eu fosse um pombo e uma bala tivesse acertado meu peito. Como uma ave frágil, senti os últimos segundos, o sangue parou na metade do meu estômago enquanto meu rosto perdia a coloração. Lembrei de tudo o que tinha acontecido no dia anterior, de como tinha parado ali, o motivo pelo qual minha cabeça doía, meu coração queria parar de bater e o porque eu me sentia atingido por uma bala.
Aos poucos, as imagens iam se desenhando vivas na minha mente e eu já começava a me arrepender por ter feito tanta força pra lembrar do que tinha acontecido.
Lembrei daquela garotinha linda, de olhos imensos. A bolinha dela veio rolando em direção aos meus pés. Eu abaixei e peguei. Ela sorriu na doçura de seus quatro anos. Aqueles olhos grandes de boneca me lembravam... Mas antes que eu pudesse concluir isso, uma voz cortou meu pensamento.
- Agradece o moço, Malú.
Então você sorriu. Era você. Continuava linda, como sempre.
- Oi, Pedro...
- Nossa, Elis, quanto tempo!
- Pois é...
Então você puxou a menina pela mão e disse.
- Agradeça o moço, Malú.
- Nossa, é sua irmã? Como ela tá grande!
Então você riu, levantou as sobrancelhas daquele jeito que você faz quando ouve uma pergunta idiota mas tenta ser gentil. Eu achando que íamos embarcar numa conversa sobre tudo que vivemos então você disse.
- É, Pedro. A minha irmã tá tão grande que tá com nove anos já...
Pensei um pouco, olhei pra menininha segurando a sua mão. Ela não podia ter nove anos. Tentei sorrir e perguntei na minha inocência.
- E quem é essa menina bonita?
- É minha filha, Maria Luiza.
Foi o tiro. O tiro no pombo e eu era o pombo. Nunca o sentido de uma frase doeu tanto. Tentei dissimular meu assombro, minha estupidez, tentei com um sorriso torto dizendo que ela era a sua cara. Mas não aguentei. Procurei qualquer vestígio e estava ali, o que eu precisava pra morrer. Uma imensa aliança dourada na sua mão esquerda. E pior do que isso, seu olhar brilhante, intenso, vivo e ele me dizia que você era feliz. Mãe, esposa e mulher. As três em uma, numa felicidade de dar gosto. Me contagiei por um instante, como se essa felicidade me pertencesse. Parecia que eu fazia parte daquilo. Em segundos me recuperei do choque e disse, inocente, como se eu soubesse da resposta.
- Você só tem ela?
- Não, tenho um menino de dois anos, o Júlio. Mas ficou em casa dormindo com o meu marido.
Outro tiro no pombo. Desferido cruelmente pelas suas palavras doces e gentis. Era você, dois filhos lindos, porque se a menina era linda, o menino devia ser também, e o sujeito pelo qual eu me arrepiava de ciúmes naquele instante: seu marido.
Sorri um sorriso amarelo, talvez vermelho pelo sangue fictício que eu imaginava subir pela minha boca naquele instante. Quando eu deixei você me escapar, quando fiz você chorar, quando achei que não te amava, nunca imaginei que um dia pudesse  encontrar  você tão linda, segurando sua filha Malú pela mão, falando do seu pequeno J[ulio, dizendo que ele estava com o seu marido com um imenso sorriso estampado no seu rosto sereno. Eu achava que o tempo não passaria e que um dia você me diria, "ei Pedro, eu senti sua falta, agora que você voltou podemos ficar juntos."
Mas não, Elis. Deixei você escapar. Deixei você partir sem perceber que eu perdia pra sempre a luz dos meus olhos e que agora era um imenso farol a irradiar sua luz pra sua família. Sim, essa família que não era a minha. O que eu tinha agora, Elis? Nada.
Você deve ser uma mãe maravilhosa, uma companheira incrível. E eu Elis, eu joguei fora aquele "nós" porque eu acreditava que seria "eu".
Em um segundo todas essas ideias povoaram minha mente, habitaram meu coração como hospedeiros invasivos e letais. Me sentia morrer a cada lembrança desse encontro. Via você se despedindo de mim, as mãozinhas da Malú me dando tchau e de como eu me enfiei num canto da padaria e bebi, até ligar pro Beto, chorando, pedindo por favor pra ele ir me buscar.
Disse a ele que você tinha atirado em mim. Ele não entendeu. E eu só fui entender depois, Elis, que na verdade, o responsável pelo pombo morto era eu. Fui eu que dei a arma na sua mão. E você disparou o seu sorriso, sua felicidade, com tudo aquilo que você merecia e eu não lhe dei. Hoje você é a rainha, Elis. E eu sou apenas um pombo morto. Morto por dentro, um zumbi de coração machucado e culpado por isso, andando por aí, pensando em tudo o que eu fiz, vivendo por viver, porque na verdade, eu já tinha morrido há muito tempo sem você.





quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

Os mesmos erros

Tem mil coisas nessa vida que eu queria saber, mas se tem uma coisa que eu queria saber muito é por que a gente se preserva tanto do amor depois que cresce?
Tá, eu até tenho meia dúzia de repostas plausíveis pra mim mesma, mas mesmo assim, se tem uma coisa que faz meu coração e minha mente se chocarem violentamente é essa coisa da gente se fechar, dificultar tudo, criar barreiras e tal. Limites estratosféricos pra jiraya do relacionamento dar certo e ser saudável.
Claro que quando a gente tem seus 16 anos amar parece mesmo muito simples, e é claro que depois de alguns belos capotes, arranhões e cicatrizes, a gente começa a ficar mais esperto no que chamam de amor. Não se abre pra qualquer um, fica mais seletivo, mais crítico e mais limitador. Tudo é limite.
Tudo bem até acho isso saudável, mas a gente e quando digo a gente, digo porque eu também faço isso, tem uma lazarenta mania de achar que vai repetir os mesmos erros.
Então, quando a gente começa um relacionamento, a gente coloca todos os sentimentos numa tabela do Excel, compara com a tabela anterior, faz um balanço pra ver onde que erramos e o que temos que fazer pra dar certo.
A gente fica miguelando sentimento porque o último filhodap**a que passou pela nossa vida não deu valor pra gente, então, com o próximo a gente vai fazer isso, vai se conter, vai se fechar, não vamos repetir os mesmos erros.
Não, não vamos mesmo, só vamos cometer erros novos!
Queria saber em qual livro que tá escrito que amor é matemática, que amor é estatística, que a fórmula para o amor feliz e pleno está em a gente fazer um mega balanço de todos os nossos relacionamentos anteriores, colocar os erros na balança, medir as ações e tirar uma média pra saber como agir! Queria saber mesmo porque eu também sou mais uma desgraçada que fica se comedindo porque tem medo de agir errado como da outra vez!
Quais a chances da nossa super mega estatística dar certo?
Se amor fosse ciência vendia em potinho, em gotas ou comprimido. Seria ótimo, né?
Não, não seria...
Até quando a gente vai ficar poupando saliva, sorriso, cheiro, até quando a gente vai miguelar abraço, segurar o beijo, conter aquela vontade louca que dá de ligar no meio da noite só pra ouvir a voz do outro, PORQUE TEMOS QUE SER PACIENTES, PORQUE TEMOS QUE DAR TEMPO AO TEMPO, PORQUE NÃO PODEMOS SER IMPULSIVOS E COMETER OS MESMOS ERROS?! Até quando?
Não tô falando que a gente tem que meter o pé e sair fazendo o que der na telha. É claro que eu concordo e acho que a reflexão de nossas atitudes é um passo muito saudável pro nosso adiantamento como pessoas mais esclarecidas, que quando a gente se conhece melhor, consegue conviver melhor com os outros e tal. É claro que temos que refletir nos nossos erros e acertos, não tô fazendo apologia ao Carpe Diem sem limites.
Mas até aí a gente ficar achando que tudo vai ser sempre igual, que porque eu fiz de um jeito com uma pessoa X se eu fizer com Y vai dar errado do mesmo jeito? Não dá, Braseel...
Graças a Deus as pessoas são diferentes sabe e você nunca vai saber se vai dar certo ou errado se você não tentar...Bem clichêzão e bem verdade. Vamos encarar os fatos.
Porque enquanto a gente fica pensando em não cometer os mesmos erros, na verdade estamos cometendo o mesmo erro de sempre...
Nessa a gente vai podar a mágica do inesperado, a beleza da sinceridade dos atos, a luz que emana de nós quando fazemos algo pelo simples acreditar que aquilo vai dar certo. 
Vamos vivendo como máquinas, comedidos em tudo, dosando, absorvendo do outro doses homeopáticas de um amor rarefeito, quando na verdade, tudo o que a gente queria mesmo, era morrer de amor só pra continuar vivendo.

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Sobre a Mulher Banana, desmaios e a sutil diferença entre homens e moleques

Esse final de semana recebi, carinhosamente, o apelido de Mulher Banana. E vindo de quem veio, só podia ser carinhosamente mesmo.
Sou uma banana. Mas daquelas bananas que não gosta de ver filme com muito sangue, tem medo de escuro e desmaia em ambientes quentes e lotados.
Já desmaiei na Basílica de Aparecida, na balada X,Y,Z, no metrô, enfim. Sou uma banana mesmo. Baixou a pressão pode me segurar que eu vou cair. Sou tão manjada nesse assunto que quando minha visão escurece eu até aviso "me segura que vou desmaiar". Simples assim.
No paradoxo da visão escura e da falta de sentidos, não tive como fugir a comparação que está martelando na minha cabeça desde então. A linha tênue, a sutil diferença em ter um homem e um moleque ao seu lado na sua vida.
Na vida mesmo, colega, não apenas na hora do desmaio.
Porque a vida é composta por N desmaios se formos pensar metaforicamente.
Quantas vezes a gente não perde os sentidos, a razão, a vista, mesmo acordada?
Quantas vezes a gente não sente que vai cair e sente medo de não ter alguém pra segurar?
Quantas vezes a gente não se sente frágil e desorientada no meio da multidão?
Quantas vezes você não acorda de um "desmaio metafórico" e pensa, "cara, por que eu acreditei nisso?"
Pois é... A vida está cheia de desmaios, perdas de sentidos, fraquezas inesperadas. Porque mesmo me conhecendo, eu ainda tinha esperança de sobreviver na famigerada balada de sábado. Eu tava bem, bem acompanhada, tudo tranquilo, mas ah, a vida adora testar a gente. Cinco minutos no meio da muvuca e minha pressão se jogou de bungee jump dizendo "Au revoir!".
E num momento como esse, se você tiver um moleque ao seu lado, chore. Porque moleques não sabem reagir em situação de perigo, moleques não sabem como lidar com uma pessoa sem sentidos e que precisa deles pra se recuperar. Eu já tive a infeliz experiência, há algum bom tempo atrás, de desmaiar e ter que depender do auxílio de um moleque, e que sinceramente, se tivesse dependido no real sentido da palavra, tinha acabado da pior maneira que posso imaginar, porque além de me largar sozinha, comprar apenas uma miserável água, porque eu pedi pelo amor de Deus, ficou com ciúmes do outro filho da puta que tava tentando me xavecar, enquanto eu não enxergava um palmo na frente da minha mão!
Isso mesmo, minhazamiga, além do moleque frouxo, existem espécies de moleques que são tão incapazes que conquistar uma mulher, e que se aproveitam de um momento de fragilidade delas, porque imaginam que elas estão bêbadas e tentam ficar com elas. Mas eu não estava bêbada e ainda tive que me virar nos 30, sem conseguir me deslocar de onde estava até a saída da porra da balada.
Mas, quando você tem um homem, homem mesmo, pode ficar tranquila, pode desmaiar que nem uma lady, pode cair que nem uma banana, tipo eu, que ele vai cuidar de você. Ele vai te carregar, mesmo que você seja "pesadinha" como eu, rs, vai ajudar você a recuperar os sentidos, vai te proteger dos filhosdaputa e dos enxeridos, vai cuidar da sua integridade física, vai te acalmar, vai te aconchegar no peito dele pra você respirar fundo, não vai ter nojinho se você vomitar, vai comprar coxinha da Real pra você, mesmo que você não coma e no fim, vai fazer você se sentir a pessoa mais especial mesmo com todo seu aparente vexame.
Porque ele não se importa com isso, ele se importa com você e é aí que mora a diferença. É claro que no dia seguinte ele pode te dar o apelido carinhoso de Mulher Banana, Bananinha, mas depois de tudo, até que ele tem crédito, rs...
Por isso, olha bem pro cidadão que tá ao seu lado, pensa bem, porque é na hora do aperto que a gente conhece as pessoas, e eu tenho certeza que se um dia você desmaiar, em qualquer sentido que seja, figurado ou real, você vai querer que alguém te segure, mesmo que no dia seguinte ele sorria pra você aquele sorriso lindo que só ele tem, te abrace e diga "Minha Mulher Bananinha!".

domingo, 24 de fevereiro de 2013

Vitória Régia

Lembrou-se do reflexo da Lua visto do pier. De como ela parecia valsar nas águas tranquilas, bem lá no fundo, quase como um convite ao desconhecido. Lembrou-se da história de Naiá, que sua tia lhe contava sempre, quando ainda era uma menina. Dizia fazendo vincos pelo rosto marcado pela idade e pela bondade de sua alma:
- Sabe, fia, Naiá era uma índia muito linda, a mai bonita de todas. E quando ia pra beira da lagoa, era pra namorar a Lua. Achava que a Lua era um guerreiro que morava no céu, fia...
E lembrou cada detalhe da lenda da Vitória Régia, depois ficou pensando que a vida devia ser como a vida de Naiá. É claro que a índia teve um final meio trágico, mas ao renascer como uma flor, pensou que isso simbolizava, de uma certa forma, um desabrochamento para vida de verdade.
Tínhamos que mergulhar nas águas do desconhecido em busca de algo para nos encontrarmos.
E Indira tinha que mergulhar naquelas águas. Tinha que ir de encontro ao reflexo da Lua. Não porque acreditasse que era uma ilusão, mas queria ser uma estrela da água, queria deixar seus cabelos afundarem devagar e ceder as mil e uma gotas. Queria molhar a pele clara e tiritar de frio, sentir a barriga encolher e as costelas ficarem mais evidentes por isso.
Não queria passar a vida olhando o reflexo da Lua na água, pensando como seria dissipar aquela imagem, como seria mergulhar de encontro a ela. Não queria passar a vida evitando tudo porque o medo poderia retê-la na superfície.
Não dá, Indira, não se pode viver a vida com tanto medo de tudo.
Indira tinha que ser Naiá. Levantou-se e pegou as chaves do carro. Dirigiu meia hora e bateu ali. Dois minutos e ele abriu.
- Di? O que você tá fazendo aqui uma hora dessa?
- Oi...Desculpa chegar sem avisar, eu não quero ser invasiva nem melosa, mas eu tava pensando em você e decidi passar aqui, queria te fazer um convite.
- Convite?
- É..
- Diz!
Ele sorriu. E todos aqueles dentes bem alinhados e perfeitamente brancos faziam lembrar o brilho da Lua. Aquele brilho que ela se encantou e a fez pensar que Indira tinha que ser Naiá e de repente ele era a Lua. Iluminou-se por dentro com o sorriso dele. Abriu um sorriso bem dela e disse:
-Vamos nadar lá no lago?
- Agora?
- É, eu queria tanto te mostrar uma coisa.
Ele sorriu, quase como que se entendesse o que ela queria dizer.
Eles foram juntos, quase sem falar, e a Lua, em sua majestade, iluminava a estrada. Em pouco tempo chegaram. Ele tirou a camiseta, ela puxou-o pelas mãos enquanto caminhavam lentamente em direção a Lua no lago.A noite estava muito quente. Ficaram quietos até que as marolas que seus corpos fizeram em contato com a água desaparecessem.
- Olha...
- Nossa, parece que ela tá aqui.
- Mergulha comigo?
E de mãos dadas eles afundaram nas águas escuras em busca da Lua. O reflexo se desfez com a agitação dos corpos que eram banhados pelos raios de prata da confidente dos poetas e inspiração dos apaixonados. Quando subiram, aproximaram-se. Ele a beijou e minutos depois ela sorriu:
- Foi assim que Naiá se apaixonou pela Lua...


segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

Vem, garota...

Vem, garota, que agora já chegou.
Você já deu tempo ao tempo, o passado já esfriou.
E aí, garota, tá esperando o que?
Talvez ele não tenha um cavalo branco, talvez chegue de busão, mas e daí, garota, o que você tem pra oferecer?
Abre seu coração. Caia nessa lábia, entre nessa dança, tira o medo, o embaraço e o soutien. Que mal tem querer ser feliz também?
Vem, garota, mas vem correndo de verdade!
E se você cair, levanta!
E se machucar, sara!
E se doer, passa!
Tudo passa, garota, leva tempo mesmo, mas que tempo mais que você quer? Deixa essa bobeira de relógio pra lá.
Os meses, as semanas, os dias. E se ele fizer valer a pena tudo isso?
Como que você vai saber se ele tá falando a verdade se você não tentar acreditar? E como você vai sentir que ele tem pegada se você não se deixa pegar, enroscar, envolver, sentir. Os poros, os pelos, as pernas. Mas sobretudo, garota, o coração.
Deixa o coração duvidar, deixa ele acreditar, mas deixa ele ser coração! Esse é o papel dele!
 Coração que bate acelerado, que quer sair pela boca, se atirar no colo, ouvir música melosa e acreditar de novo, e de novo, e de novo. Quantas vezes forem necessárias, possíveis, prováveis e improváveis...
Abra seu coração, garota...
Deixa ser...
Vem, garota! Vem que a vida não espera!
E você tá esperando o que mesmo?
Ah tá. Então larga essa bolsa na mesa, deixa os papéis no canto, tira esse brilho de tristeza, põe um brilho nos lábios, sente o cheiro da noite, escuta o que ele te diz, fecha os olhos pra respirar, diz coisas que você quer.
Porque todo mundo vai falar de tudo. Vai falar se você quiser, vai falar se você não quiser. Todo mundo fala o tempo todo. Você vai deixar eles decidirem por você?
Vai ser conduzida por eles, pelo medo e pela sua tristeza acorrentada?
Deixa tudo pra lá. Deixa as estrias, as celulites e tira esse vestido. Deixa que vejam sua beleza, vem nadar nas águas das vida! Mergulha fundo como sereia, brinca com os peixes, abre os olhos na água doce, deixa o rímel borrar.
Vem, garota...
Vem sorrir pra vida...
Vem você também....

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

Joca

"Era muita ingratidão" pensava enquanto caminhava pelas ruas agitadas, chutando o chão, revoltada com os últimos acontecimentos.
Ninguém valorizava suas ideias, seu intelecto e agora, como se não bastasse ter sido quase demitida, tinha levado um pé na bunda daquele arquiteto mal resolvido e descobrira que a amiga estava trocando whatsapp com ele.
Queria ver todos eles amarrados juntos, a beira de um vulcão, onde ela, rainha dos Maias, os sacrificaria em prol da sua paz de espírito. Ele, ela, o chefe, as amigas falsas, todo mundo. Ninguém prestava naquela cidade ordinária, todo mundo era ruim. Enquanto resmungava por dentro, teve a atenção tomada por um vuco-vuco no sinaleiro mais próximo.
Carros desviavam de um pobre vira-lata, ainda pequeno, que muito perdido, estava na iminência de morrer atropelado pelo próximo desavisado que não percebesse o cachorrinho no meio da rua.
Como se sua vida dependesse daquilo, jogou os cadernos e a bolsa no chão e correu na direção do pequenino.
Sentiu o calor da moto passar pelas costas, as buzinas e os motoristas que se agitavam gritando "sai daí, sua maluca!".  Havia acabado de alcançar o cãozinho, quando um Fiesta veio em sua direção. Agarrou-se ao pequeno vira-lata enquanto murmurava suas últimas palavras, "Eu te amo, Joca!".
A rua toda ouviu os freios, enquanto ela, agarrada na nova razão de sua vida, fechava os olhos evitando ver a colisão evidente de seu corpo com o Fiesta ensandecido.
Um multidão se fez em volta dela. O motorista desceu do Fiesta, com belo sotaque paulista que tinha, gritando.
- Você tá maluca, garota?
Ela abriu os olhos e viu aquele monte de gente em volta dela, o cãozinho no seu colo, com o coração mais acelerado que o seu e o seu quase assassino, como assim pensou, na sua frente.
Levantou-se com a ajuda dele que perguntava a todo tempo se ela estava bem.
- Entra no meu carro, vou levar você num hospital.
- Pode ser um hospital veterinário?
Ele olhou pro cãozinho no colo dela e disse.
- Claro, vai, entra logo que tá todo mundo buzinando.
Ela recolheu as coisas com a ajuda de um estranho e entrou no carro dele.
- O que aconteceu, seu cachorrinho fugiu?
- Não. Ele tava perdido no sinaleiro, ia ser atropelado e eu fui salvá-lo.
Ele sorriu.
- Então você é dessas malucas protetoras dos animais?
- Não. - ela franziu o cenho - Eu só me apaixonei pelo Joca, foi amor a primeira vista.
- Amor a primeira vista... Você acredita nessas coisas?
- Claro!
- Que bom.
Foram até o hospital veterinário mais próximo e enquanto ela caminhava em direção a sala com Joca no colo, ficou observando quão linda era a maluca protetora dos animais.
Seus longos cabelos escuros, levemente encaracolados, com um resto da última tintura nas pontas, andar suave, olhos azuis e intrigantes faziam-no pensar no que o fizera desviar a rota do trabalho e quase atropelar a moça e seu cachorro num sinaleiro da Liberdade.
Entre suas meditações, uma hora e meia havia passado. Saíram de lá eram quase oito da noite. Ela, ele e o Joca, que agora dava lambidas apaixonadas na sua dona e no seu dono, segundo o cãozinho pensava. Levou-os até o apartamento dela e ela sorriu sem graça quando o carro parou.
- Acho que eu lhe devo desculpas e um muito obrigada. Você não quer subir fazer companhia pra gente? Íamos jantar sozinhos.
- Você ia jantar sozinha, né?
- Se não tivesse encontrado o Joca, sim...
- Então, pode por mais água no feijão.
- Não como feijão, pode ser hamburguer?
Ele sorriu enquanto desciam. Ela olhou nos olhos do cãozinho que amorosamente lhe dava beijos, como um sinal de gratidão eterna por ter salvo sua vida. Gratidão, era tudo aquilo que ela precisava naquele dia. E ao mesmo tempo, sem que ela soubesse, em pensamento, ele agradecia aos céus por ter desviado sua rota de trabalho naquele dia.

terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

Offline

Eu não quero um amor que me mande um email grande, de letras miúdas dizendo da minha importância na vida dele.
Eu não quero um amor que me marque numa foto pra todo mundo ver que estive com ele, ou um aplicativo que mostre que estivemos juntos em qualquer lugar do Brasil e do mundo.
Eu não quero um amor que faça meu celular piscar freneticamente me perguntando se almocei, se dormi, se morri.
Eu não quero um amor que me mande mensagem dizendo que sou linda, cinco minutos depois de termos deixado o mesmo ambiente se ele não teve coragem de me dizer isso quando estava ali, bem na minha frente.
Eu não quero um amor que tenha os dedos agitados no celular, que converse comigo todos os dias sem ao menos ouvir o tom da minha voz, sem perceber que depois daquelas palavras eu poderia estar com voz de choro, triste ou acuada. Sem ao menos perceber a decepção nos meus olhos, sem perceber que minhas mãos agitadas e que o movimento constante que me faz cheirar meu cabelo quer dizer alguma coisa.
Eu não quero um amor que exista apenas nas telas do celular, do computador.
Porque eu não sou um android. Eu não sou um aplicativo da Apple pra um Iqualquercoisa. Eu não sou uma máquina, eu não sou um contato do celular, uma foto bonita no facebook, no Instagram, em qualquer lugar digital.
Eu sou uma pessoa. Pessoas dessas de verdade. Que tem um celular e um computador, mas que existe antes deles e vai continuar existindo sem eles.
Pessoa de carne, osso, gordura, estria, celulite, cabelos, que ora parecem revoltados, mas serão os mais macios que você poderia encostar na sua vida.
Eu não tenho botão de desliga. Nem de mute. Falo muito mesmo e talvez não saiba a hora de ficar quieta.
Eu não tenho conserto. Tô tentando me aprimorar de outras formas, mas eu não conheço nenhum especialista que se atreveu a apertar meus parafusos.
Não dá pra você me reiniciar. Tudo que a gente faz pros outros fica, de alguma forma, guardado. Mas não é num cartão de memória que você pode fazer uma limpeza nele e já era.
A máquina humana, e eu detesto essa definição, é muito mais complexa do que o último IOS que a Apple lançou.
E eu não vou me render a vida digital e muito menos a um amor virtual. Eu preciso de amor, de amor de verdade, de gente que tenha poros abertos, coração batendo, pele quente ou fria, talvez seca, olhos que pisquem a todo instante e um corpo que se movimente mesmo parado.
Eu preciso sentir a circulação do sangue, eu preciso ver a movimentação dos músculos no sorriso. As suas articulações, juntas, juntos.
Preciso ver defeitos e ressaltar a beleza nas coisas simples. Eu preciso de um colo quente nos dias frios. De uma palavra suave nos momentos de explosão.
Eu preciso do timbre da voz, da expressão do rosto, dos olhos, do retorcer da boca se lhe desagrada algo ou dos dentes que surgem quando algo lhe agrada.
Eu não quero só mensagens fofas, eu quero ouvir da boca de uma pessoa que fala, anda, se agita e tem hálito de chiclete, de comida, de qualquer coisa, me dizendo, olhando nos meus olhos, o quanto eu significo pra ela, ou do quanto essa roupa fica melhor em mim, ou simplesmente ver no rosto dela o quanto ela gosta de mim quando eu simplesmente sorrio.
Eu não posso, não quero e não vou seguir gostando de uma figura imaginária que existe atrás de um contato do meu celular. Porque quando as pupilas se contraem e dilatam, frente a frente, daí a gente vê quem é quem.
E sms, whatsapp, email, inbox, não existe nada que vá mudar esse contato olho no olho, pessoa a pessoa que existe quando a gente encontra alguém. E não vai adiantar se esconder numa foto bonita ou numa postagem legal, num comentário romântico ou numa mensagem de "to com sdds", porque o que a gente é de verdade não é só aquilo que a gente faz atrás das telas, mas somos muito mais aquilo que fazemos na vida, olho no olho, cara a cara.
A vida virtual é importante, não sejamos hipócritas. Quem é que não gosta de mensagens fofinhas? Mas o que eu quero dizer é que só isso não basta! Amor não é um arquivo que a gente faz download e deleta quando quiser!
E eu não quero um amor virtual!  Eu quero um amor de verdade! Mas só pra constar, pra você, eu tô offline.



sábado, 9 de fevereiro de 2013

Primadonna

Tô sorrindo aquele sorriso falso, o mesmo que eu sorri pra você naquele dia que te vi da última vez.
Eu sou uma mera expectadora da sua vida enquanto você se esquiva da minha.  E eu assisto você curtir as fotos no facebook de todas aquelas meninas de cabelo mais falso que o meu sorriso, que eu poderia chamar de vagabundas, mas na verdade, quem eu deveria pensar em xingar aqui é você.
Mas eu não vou xingar, mesmo que o meu coração insiste em vaiar a sua atuação. É tudo muito simples pra quem não se envolve, pra quem não se entrega, pra quem não se dá o direito de viver assim, de cabeça, mergulhar, como eu quis fazer com você. Como eu fiz por você...
Pra mim tava sendo muito difícil me abrir de novo pra alguém, mas pro seu sorriso, o seu maldito sorriso, parecia extremamente fácil querer amar de novo. Me apaixonar e enfim, me libertar.
Mas a sua indiferença me aprisionava dia a dia num mar de dúvidas e aquele beijo no rosto...Por que você me beija no rosto? Eu não quero ser sua amiga. Nunca quis. Amigos não entrelaçam os dedos nos cabelos das amigas, trazendo-as mais perto, enquanto respiram o mesmo ar, roubando oxigênio um do outro, roubando a vergonha, o medo, o pudor.
Eu não viajei até lá, não me sentei ali, não me vesti daquele jeito porque eu queria ser sua amiga. Não é esse papel que eu quis pra mim quando sorri pra você.
Eu sou péssima atriz. Eu não consigo fingir ou simular, atuar num papel que não condiz com a verdade que eu quero pra mim, pra nós.
Eu era a Primadonna. Eu queria ser a Primadonna. Pra sempre, sua musa soberana, enquanto a gente aplaudia o esplendor da vida por ter feito essa maracutaia toda pra gente contracenar nos palcos do amor, juntos.
Mas, na minha ópera, você gaguejou. No meu recital você desafinou, tirou seu corpo, entrou pra coxia, não soube enfrentar a multidão nervosa que veria você me dar um beijo na boca e então, me beijou no rosto. De novo.
Então o teatro ficava vazio, dia após dia, enquanto eu fazia a mãe, a filha, a irmã, a amiga. Contracenava sozinha, gesticulava pro nada procurando Deus, porque talvez só Ele me entendesse.
Sabe, talvez eu tivesse encenado todos os papéis se você estivesse comigo no palco. Eu sei dançar, eu canto bem. Eu seria a Primadonna. Era pra eu ser a Primadonna.
Na minha peça eu te dei o papel principal.
Mas você não quis ser meu galã. Você negou James Dean. Você não quis ser meu amor.
Quero só ver quem vai comprar os ingressos desse romance sem final feliz.
Eu me levantei da cadeira, com os olhos cheios de lágrimas, um coração espremido no peito. As cortinas se fecham enquanto eu saio. Eu não vou mais aplaudir você.
C'est fini.

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

Chuva

Ainda chovia quando saiu do trabalho. As gotas grossas que caíam do céu encharcavam os transeuntes que ousavam sair sem guarda chuva, julgando que era uma garoa passageira.
O ponto estava lotado, mentalmente ele procurava um lugar debaixo do toldo, antes de atravessar a rua e chegar até lá.
Escondeu a cabeça com o casaco, atravessou no sinal amarelo, quase foi atropelado por um motoboy e finalmente chegou num pedaço do toldo reservado a ele.
Não queria olhar as pessoas nem ter que sorrir forçado pra qualquer desconhecido que lhe dissesse "que chuva!". Era óbvio que estava chovendo, era óbvio que estava molhado e nenhuma conversa num ponto de ônibus podia ser agradável naquela circunstância. Passaram três conduções lotadas. Na quarta se aventurou a entrar e quase perdeu um pedaço da jaqueta na porta. Foi amontoado no meio da multidão, que buscava um lugar pra se segurar.
Tudo aquilo o incomodava, apesar de estar deveras acostumado a essa rotina de chuva. Mas nesse dia especificamente, incomodava mais. Algo doía que não as gotas da chuva, parecia que o céu chorava e ele se sentia triste. O trajeto até o ponto próximo da casa durou quase uma hora e meia. Quando desceu, enfiou o pé numa poça de água suja e saiu esbravejando por dentro a maldição de ter esquecido um guarda-chuva. Chegou em casa pingando, escorregou na porta do elevador de serviço, comumente usado por todos condôminos nesses dias. Olhou-se no espelho e desviou o olhar. Não queria olhar pra ninguém.
Entrou em casa, arrancou a roupa, e foi pro chuveiro. Um banho quente certamente lhe traria paz.
Mas embaixo da ducha, com a água a lhe esquentar os poros arrepiados, ainda sentia algum incômodo. Pensou um pouco, sentiu-se triste, talvez fosse a chuva, o tempo. Ele detestava dias cinzentos.
De repente, entre divagações sobre a vida, o trabalho e os dias, uma dor aguda fez-lhe conter a respiração. Mas não era dor no corpo, dor no peito, era dor na alma. Daquelas dores que só as agulhadas da saudade são capazes de provocar. Dor sufocante, que prende choro na garganta como uma pedra pra depois cuspi-lo em desespero.
Começou a chorar quando lembrou-se dela. Fazia dias que não se falavam. Ela era muito certinha, queria uma resposta e ele não sabia bem ao certo o que era tudo aquilo. Sentia-se inseguro, mas como expressar, como dizer?
Não pensou que a figura dela fosse lhe provocar tanta tristeza e esse misto de sentimentos intraduzíveis e incoercíveis que debandavam da sua alma para os olhos.
" Eu queria mesmo dizer que vou conseguir, mas eu não posso viver assim". A imagem dela dizendo essas palavras soavam como apunhaladas dadas por ele mesmo no próprio coração. A rotina, a vida, os amigos, a distância e as outras mulheres apagariam a imagem dela em semanas. Mas, de repente, ele descobrira que ela era mais importante do que a importância que ele havia dado a ela desde que se conheceram.
Miriam. Como se apresentava linda agora diante de seus olhos cobertos por lágrimas. Sentiu frio no corpo mesmo debaixo do chuveiro quente. Será possível a gente descobrir que ama alguém assim?
E por que tinha sido depois? Porque não lhe dera valor, amor, porque não a reteve em seus abraços, em seu abraço, em sua cama enquanto ela cruzava estradas, mares e vencia o amor próprio ferido por ele, para encontrá-lo, porque ainda não se dava por vencida, mesmo diante de tanta insegurança e falta de resposta.
" Não desista de mim, Miriam..." pensou alto durante o banho. Quase uma semana sem falar com ela, talvez ela ainda o quisesse ver.
Saiu do banho sem tirar o sabonete do corpo como deveria. Se enxugava enquanto pegava o celular.
"Nunca liguei pra ela..." pensou com algum remorso. Mas arriscou.
Ligou e o coração parecia que ia se lançar e segurar o telefone, dizendo " Miriam, atende logo, fala comigo, por favor!".
Mas o telefone chamou, chamou, chamou e quando ele já se dava por vencido, fez-se ouvir uma voz.
- Sua chamada está sendo encaminhada para a caixa de mensagens...

domingo, 3 de fevereiro de 2013

Carta para Madá - Sobre sereias, barcos e o (a)mar

" Madá, eu queria estar mais perto pra ver nos seus olhos tudo aquilo que você me escreveu. Eu poderia dar uma resposta mais objetiva e sincera se eu visse a confusão nos seus olhos, se suas pupilam se dilatam e se contraem, como uma menina tímida, enquanto você fala dele, se você, enquanto se perde quando fala dele, faz aquela cara e diz " eeee...". Se você vai alcançar o horizonte com seus olhos em busca de respostas que você nem sabe as perguntas.
Sabe, Madá, fazia tempo que eu não via você apaixonada. Aliás, achei mesmo que você estivesse apaixonada e abri um largo e dentado sorriso quando li suas cartas. Talvez seja o amor grato Madá, "com sabor de fruta mordida" como ele disse um dia.
Mas depois parece que a fruta ficou marrenta, você ficou amuada e senti falta de não ser seu colo amigo, levar você pra tomar um gigantesco sorvete, depois comer churros, caminhar e dizer " Oh, Madalena", enquanto você me diz "Di, na próxima vida vamos vir melhores maridos, não melhores amigos?!"
Imaginei que você tivesse chorado enquanto olhava para as estrelas, pra um céu a noite, ou num crepúsculo qualquer, perguntando aos astros da noite se eles foram testemunha do seu amor, do porque de tudo isso, enquanto seu suspiro me alcançaria e eu pediria a minha Iemanjá pra cuidar docê, nega.
Ah, minha molecona levada, minha mulherona com sorriso de menina, como você deve ter chorado com a aparente indiferença desse cidadão. E como eu quis grudar ele pelo colarinho e dizer "irmão, você vai perder a mulher mais sensacional da sua vida". Mas eu me acalmei, né Madá, no frio de Zurique não posso fazer muita coisa por você.
Depois da sua última carta, confesso que fiquei numa louca expectativa pra saber o que tinha acontecido, como um lunático pela sua série de TV preferida, eu estava me divertindo e sofrendo com as suas histórias. E elas dariam um livro, né? Sei que você vai torcer o nariz quando ler isso porque você me disse uma vez "que culpa eu tenho se eu me arrisco a nadar no mar, enquanto eles ficam esperando o amor no porto?"
É, Madá, você é a sereia mais corajosa que já conheci.
Confesso que nessa última carta, eu queria mesmo ver você, olhar no fundo desses seus olhos imensos e devoradores de alma, como sempre digo, e ver o que há atrás dessa história.
Sabe, Madá, a vida não é tão fácil. Sereias enfrentam grandes ondas todos os dias e por vezes, o tédio das marolas e da calmaria.
Talvez, Madá, ele tenha pisado naquela plantinha que você regou. E talvez ela não cresça mais. Talvez ele não seja mais tão bonito, e enquanto você olhava pra ele, as cores vibrantes que antes eram todas só dele se misturaram as cores da multidão.
Sabe, Madá, tem gente que faz a diferença, mas tem gente que não quer fazer.
E talvez pela indiferença, a sereia percebeu que talvez seja melhor abandonar o navio, antes que ele afunde.
Sinceramente, não me preocupe se o navio afundar, Madá, porque você sabe nadar como ninguém. Já sobreviveu a naufrágios e hoje é a capitã do seu coração.
Talvez, ele seja um marujo atrevido, mas que quer descer no próximo porto da ilusão...
Mas talvez seja a hora de ser paciente, dar tempo ao tempo, e quem sabe, o marujo atrevido seja aquele que vai lhe ajudar a conduzir o leme do coração para os caminhos seguros do amor?
Sabe, Madá, sinto sua falta, minha sereia, minha amiga, minha irmã do coração.
E então, Madá, você quer uma resposta eu presumo. Já imagino seus grandes olhos devoradores de alma, procurando uma resposta enquanto as linhas acabam, suas mãos bonitinhas com seu dedinho torto, quase amassando esse papel de raiva de mim, porque você quer uma resposta.
Mas, Madá, eu não sei.
Ah, Madá, o mar é um imprevisto.
Amar não é previsto.
Cuide-se, Pequena Sereia..."

terça-feira, 29 de janeiro de 2013

Choconhaque

Mordia os cantos das unhas sem esconder. Depois lembrou que detestava ver as pessoas com as mãos na boca e se corrigiu. Estava mesmo muito distante do que gostaria.
O dedo ainda úmido da saliva de segundos antes deslizou pela tela do celular, desbloqueou e viu ali. A tecnologia que entregava o descaso. "Mensagem Lida as 19:19".
Apertou o botão e bloqueou o aparelho novamente. Já passavam das onze e meia da noite.
E enquanto via a fumaça do choconhaque subir na atmosfera triste daquele bar, sentiu raiva antes de ter vontade de chorar.
Ele é só mais um cara bonito, Nina. Dizia isso todos os dias, há mais ou menos cinco dias consecutivos. Era o novo mantra pra se convencer e se blindar daquele feitiço maldito que a arrastava direto pro sorriso dele.
Um dia ia funcionar e a maldição estaria quebrada. Quem sabe da próxima vez que se vissem, e talvez isso demorasse um pouco pra acontecer, porque tudo parecia mais importante que ela, mas talvez ela pensasse apenas nisso e não sentisse mais o coração ansioso tentando arrebentar o peito dela pra se lançar e dizer "ei, cara, senti sua falta pra caralho!".
Nina riu. Riu de si por pensar num coração animado, se lançando no pescoço dele. Sorveu um gole do choconhaque com cuidado. Fez um barulho e ela se irritou. Detestava esses barulhos que as pessoas faziam com a boca pra beber coisas quentes. Inclusive ela própria.
Não podia esperar nada dele. Não sabia mais o que esperar dele. Ele sorria, a cumprimentava e aquele beijo no rosto dizia pra ela em todas as letras cortantes e ásperas "somos apenas amigos".
Mas se confundia tanto porque todos os dias ele lhe escrevia de manhã, logo nas primeiras horas do Sol nascente. E ela pensava no tamanho da prepotência dele em querer que ele fosse a primeira coisa que ela pensasse ou "visse" quando acordasse, como quem diz "talvez eu não me lembre de você, mas não se esqueça de mim".
Revoltou-se. E amassou o restante do biscoitinho de manteiga com o dedão.
Se fosse um homem assim, talvez ela gostasse de ter uma mulher como ela, linda, zelosa, preocupada e dedicada a perguntar todos os dias se ele estava vivo, se havia comido ou dizer que tudo vai ficar bem, só pra sabê-lo mais feliz com a dureza da rotina diária.
"Mas ele tem mãe, Nina! Ele tem mãe!" Gritava dentro de si com a mesma intensidade do auto-falante do cara da pamonha. Ecoava no coração, na mente e em todos os ossos dela.
Eu não quero ser a mãe, nem a irmã, nem a amiga. Nem aquele sorriso forçado de domingo de manhã de quem queria olhar pra ele e chorar, apontar o dedo na cara, dizer aquela história que lhe contei a primeira vez que saímos como naquele filme que a moça repete essa cena dizendo "não sei porque eu achei que com você seria diferente."
Estava vermelha de raiva. Sentia todo o sangue concentrado nas bochechas. Por conta do frio, do choconhaque e da raiva.
Daí lembrou do rosto dele. De como ele ficava lindo quando ela o via bem de perto, com a testa encostada na testa dele, respirando o ar que ele expirava, quase morrendo sem oxigênio puro, mas e daí. Era quase uma rosa no deserto sobrevivendo à tempestades de areia.
As esperanças desapareciam a medida que o choconhaque sumia da caneca. 
Em breves instantes, ela vomitava pelos olhos aquilo que tinha engolido da última vez que ele disse "a gente se fala."

segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

Sobre príncipes e princesas - Coisas que eu escrevi para Alice e Giovana


Estávamos eu, Alice e Giovana, num raro momento onde minhas duas irmãs, que por sua vez, não são irmãs (não biologicamente, talvez espiritualmente, mas isso é papo pra outro dia), brincando com miniaturas das princesas da Disney.
Enquanto encenávamos festas em que Aurora, Bela e Branca de Neve iriam, num dado momento, Giovana,que já tem três anos e dava vida à princesa Aurora, disse para Alice, que tem seus dois anos e dava vida á Branca de Neve.
- Vamos, amiga, vamos lá embaixo esperar o príncipe!
Como se numa festa onde as princesas estivessem no salão principal, desceram a escada imaginária para encontrar o príncipe. Nós não tínhamos miniaturas dos respectivos príncipes para brincar, então colocamos o faz-de-conta em ação.
Enquanto observava meus pequenos tesouros brincando inocentemente, ao mesmo tempo, culpava e maldizia o maldito Walt Disney, porque já deixei registrado aqui nesse blog, minha revolta pelo fato dele ter glamurizado e purpurinando as relações príncipe-princesa. Sabemos que não foi ele quem inventou os contos de fadas, mas ele tem uma certa culpa no cartório em nos iludir com seus romances, isso ele tem.
Pois bem. Pensei que as minhas meninas vão crescer e ali, naquelas cabecinhas encaracoladas e semi-lisas, já está incutida a ideia de que somos princesas e temos um príncipe.
Eu podia ser radical e acabar com a infância delas, dizendo que príncipes não existem e assim eu estaria poupando futuros sofrimentos quando elas derem com a cara na parede com a sua primeira decepção amorosa.
Mas adiantaria frustrar uma infância? Eu cresci tão feliz acreditando em príncipes e princesas... Não é justo com elas.
E também, não é bem assim...
Existe uma série de coisas que eu gostaria de dizer à vocês, minhas meninas.
E muito embora meu coração, nesse momento, insista em doer quando penso num particular príncipe (des)encantando, eu direi à vocês: acreditem, príncipes existem.
Existem sim.
Não do jeito que a gente imagina, não do jeito que a gente quer. E digo mais, eles não são príncipes 100% da vida e do tempo. Porque nem nós somos princesas 100%, certo?
Mas num dado momento da vida, numa fração de segundo, quando o olhar dele cruza com o da gente, todos os músculos da face, do corpo, tremem, enquanto a gente tenta disfarçar mas não consegue parar de sorrir, quando o coração acelera tanto, bate forte que parece que vai sair pela boca, as mãos se agitam inquietas e o mundo todo fica mais brilhante enquanto as cores dele se exaltam, berrantes e sinceras, então, por um instante, ele era um príncipe.
É claro que depois ele pode virar um ogro, uma fera ou um bambi, nunca se sabe. Mas a forma como encaramos as pessoas é que diz respeito do que elas são pra nós. Num instante mágico, tudo pode ser. Como num passe de mágica, eu era princesa e ele, meu príncipe.
Príncipe não é aquele cara que vai fazer tudo o que vocês quiserem, lamber o chão que vocês passarem, que vai se negar pro mundo e se mutilar emocionalmente se vocês não quiserem ficar com ele. O nome disso é otário, ou maluco. Independente do nome, fujam desse tipo, é só dor de cabeça.
Príncipe também não é aquele cara que conquistas meia dúzia de princesas otárias e outra dúzias de bruxas disfarçadas. O nome disso é cafajeste, de qualquer forma, fujam também.
O que eu queria que vocês entendessem, minhas amadas meninas, é que o amor não é exatamente como a gente acha que é. A gente não escolhe o príncipe que vai gostar, se pudesse escolher, seria maravilhoso.
Queria lhes dizer também, que não adianta a gente se fechar numa torre, ainda que sentimental, esperando pelo príncipe ideal. Ninguém é igual a ninguém. Todos somos humanos, únicos, erramos, acertamos todos os dias. Por que esperar a perfeição? Quando a gente ama vê até graça nos defeitos.
E também, não adianta esperar que eles façam tudo, porque a gente também tem que enfrentar os dragões da vida se quiser ficar com uma pessoa de verdade e não vai ser esperando sentadas que vamos conseguir.
Eu queria dizer tanta coisa a vocês, mas eu ainda tenho muito o que aprender.
E quando o príncipe for embora, quando ele se mostrar um ogro horrível, quando a última pétala da rosa cair, quero que vocês saibam que eu estarei aqui para lhes dizer que vocês são e sempre serão minhas princesas!






sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

Lívia

Duas semanas que não se falavam. Silêncio que parecia passar despercebido entre os afazeres dele e a rotina agitada que a cidade lhe impunha. São obrigações e leões a vencer, todos os dias.
Mas é verdade que as obrigações estavam mais monótonas ainda sem o celular frenético piscando, com uma mensagem dela que o fizesse sorrir. Superaria, pensou.
Mas a imagem mental não afeta tanto quanto a aproximação de fato. Imaginá-la, pensar nela, doía um pouco, mas como seria quando cruzasse com ela? Possibilidade remota, mas existia.
Foi pensando nisso no caminho, atrasou-se e quando lá chegou, não a viu. Suspirou um pouco decepcionado, mas talvez fosse melhor assim. 
Mas os olhos dele foram puxados na direção de um ponto, por um magnetismo incontrolável. Era ela. Caminhava a passos lentos, respirando profundamente o ar da manhã até que foi atraída igualmente pelo mesmo magnetismo. 
Fez-se um sorriso morno nos lábios dela e ele sentiu o coração acelerar. Batidas descompassadas fora do ritmo dos passos dela. Ela caminhava lentamente, olhando pro céu, pro chão até sorrir.
- Oi...
- Oi, Lívia.
Então chamaram o nome dela, ela balbuciou um já volto e foi se afastando. E a medida que ela caminhava pra longe, o coração dele se comprimia, em batidas dolorosas e uma sensação de perda que não sentira até então.
A saliva engrossou na boca, o nó parou na garganta e os olhos anunciavam a chegada do arrependimento. Lívia, nossa, ela era tão linda. Agora parecia mais. O ar da manhã fazia bem a ela. O perfume de morango silvestre com frutas cítricas, o olhar profundo que ela tinha. Será que ainda gostava dele?
Mas ela parecia distante, uma distância imensa, como uma madona no altar e um desvalido arrependido de toda sorte que fizera mau uso.
Distanciou-se o quanto pode, não queria que o vissem abalado, especialmente ela. Uma lágrima lançou dos olhos rumo as mãos dele. Enxugou rápido. Não pensou que fosse doer tanto vê-la.
- Tá tudo bem?
Teve suas meditações amargas cortadas pela voz aveludada dela. Ela o conhecia. Parece mesmo que sabia que ele estava chorando por dentro e agora, por fora.
- Dormi mal, meus olhos estão ardendo. Acho que é sono.
- Hum...
Ela contemplava a natureza com singular serenidade. Parecia emanar dela um imenso amor por todas as coisas do mundo. Sentia que as lágrimas subiam pelos olhos, aflitas em se lançarem em direção a ela, como que um pedido desesperado por uma faísca desse amor. Ela estava tão perto, havia tanto amor nos olhos dela quando olhava pra ele. Mas o mundo, ah, o mundo parecia mais interessante que a moça singela que Lívia era. 
Sentia-se o mais desafortunado e o mais imbecil dos homens.
Ela olhou pra ele e sorriu, sem mostrar os dentes. Parecia constrangida.
Ele, sem poder conter mais a emoção que ela fazia aflorar, disse:
- Isso dói.
- Isso o que?
- Essa distância de você.
Ela calou. Olhou para os céus, como quem busca respostas ou alguma força.
- Eu sei que dói.
- Não precisa ser assim, Lívia.
- Você quis assim, João...
- Eu sei, eu fiz tudo errado. Mas não achei que fosse doer tanto ver você.
- É só seu ego ferido.- disse enquanto buscava se esquivar mas ele segurou-a pelo braço.
- Espera, Lívia. Vamos conversar.
- Conversar o que João. - disse ela com indizível ternura e mágoa no olhar.
- Desculpa? Me perdoa, vai, por favor?
- Depois a gente conversa, João. Aqui não é hora, nem lugar.
Ela se afastava com passos firmes, o coração na mão e algumas lágrimas nos olhos que não caíam.
Ele chorava já se esconder. Viu o tempo, a oportunidade de amar e ser amado, os sorrisos dela, a risada gostosa que ela tinha, o amor que ela lhe devotava, a paz que sentia quando estavam juntos, tudo se esvaindo por entre as próprias lágrimas e se desfazendo no chão, para o sol secar. Havia jogado tudo fora. Tinha perdido a mulher da sua vida por idiotice, indiferença e falta de noção.
Doeu e a medida que ela se afastava, doía mais.

Uma cômoda para o coração - quando os sentimentos não cabem em gavetas

Ganhei uma cômoda nova. Porque a minha já tinha quase 15 anos, RG, CPF e estava pedindo aposentadoria. Gavetas que caem nos pés machucam, irritam e fazem você pensar que passar um pedaço do sábado nas lojas X talvez não seja tão ruim.
Minha mãe vivia reclamando da bagunça do meu armário. Já chamou ele de Nárnia e tantos outros apelidos que ela dava pro amontoado de roupas, bolsas, pijamas e cacarecos que eu guardava nele.
A cômoda veio organizar, aliviar. Passei uma noite de sexta tirando coisas do lugar, jogando papéis fora, me desfazendo de coisas e roupas que não serviam mais. Mais do que organização material, foi a organização emocional.
As roupas, agora, separadas devidamente em roupas de sair, roupas de trabalhar e ir pra faculdade, roupas para aulas de dança e duas gavetas escolhidas a dedo para abrigar meus figurinos de dança do ventre, entre véus, saias e strass.
A bagunça do armário cessou um pouco. Não sou exemplo de organização.
Mas eu queria mesmo uma cômoda pro meu coração. Pra organizar a bagunça que você fez quando chegou.
Felizmente, eu já me desfiz das coisas velhas, dos porta-retratos antigos, cartas lidas por dez vezes e sentimentos que já mofaram.
O problema não são as coisas velhas, nem nada disso.
O problema são as minhas coisas, tão minhas e tão bagunçadas agora.
Porque eu achei que tinha organizado tudo, que sabia separar as coisas, os fatos, as expectativas, os sentimentos, que esses dois anos um tanto mais reclusa em mim mesma, apesar dos pouco envolvimentos, que eu saberia lidar melhor se alguém bagunçasse meu coração.
Mas parece que não adianta você ficar um mês, um ano, uma vida se escondendo. Ele vai te achar, de alguma maneira, não adianta. E você vai perceber que parecia melhor mesmo ficar com tudo organizado e quietinha na sua, mas no fundo, quando ele chega, quando você vê a bagunça toda no chão, nas paredes, no coração, percebe que era isso mesmo que estava faltando.
Mesmo assim, eu me sinto confusa, porque estava tão acostumada a organizar todos esses sentimentos, e de repente, eles não cabem em gavetas.
E o medo de ter que arrumar isso sozinha existe...
Mas existe também a outra metade, que sabe que se você não tivesse feito essa bagunça toda, talvez eu não teria me achado de novo.
Porque as vezes é preciso jogar tudo no chão, pro ar, pra poder achar aquilo que tava ali, amarrotado entre as roupas, perdido nas gavetas, esquecido com os sabonetes que a gente põe no fundo das gavetas pra dar cheirinho as roupas.
Eu pensei que quisesse uma cômoda pro meu coração. Eu pensei que quisesse organizar a bagunça que você fez.
Pensei tanto e no fim eu percebi que com cômoda ou sem cômoda, com bagunça ou sem bagunça, no fundo, eu só queria mesmo você.




sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

Essa menina não é uma boneca...

Achou que eu era um bibelô, um agrado da vida, como aqueles trouféuzinhos sem graça que você ganhava nos torneios de futebol do colégio, mesmo sem ter feito merda nenhuma pelo seu time.
E depois de ver que minha estética ornava bem com a sua coleção, me deixou ali, pra juntar poeira, achando que eu não fosse perceber. Me deixou ali para me olhar de vez em quando, sorrir satisfeito e pensar "é minha."
Como uma criança mimada, me colocou na sua estante, achando que eu era sua boneca de porcelana. Até o dia que eu saí andando.
Eu não sou uma boneca, nem de porcelana nem de nenhuma outra espécie.
Eu sou uma pessoa. Uma humana. E atrás do meu decote tem um coração. Você sabe o que é um coração? É o que te mantém vivo. Mas se penso um pouco, não sei mesmo como algumas continuam vivas, porque parecem que não tem coração.
Eu tenho olhos grandes e bonitos, é verdade, sem falsa modéstia. Mas eles não são de vidro, resina, cristal. São olhos que veem a indiferença de longe, que observam mais do que as retinas podem captar. Olhos que se intimidam, fixos num ponto, quando uma lágrima vem a tona e as pálpebras se comprimem, beijando-se molhadas, pra me fazer enxergar um nevoeiro depois. 
Eu tenho cabelos, brilhantes e macios porque eu cuido deles. E quando eu entrelaço meus dedos neles e levo-os até o nariz, é um sinal. Mas talvez você não tenha sensibilidade para interpretar sinais.
Tenho uma boca, que fala mais do que deveria. Mas que se fecha em silêncio, porque você não merece minha palavra.
E os meus pés, que você achou que fossem se manter fixos num ponto, esperando por você, eles me conduzem pelas belas estradas floridas, por onde eu caminho, com esse coração que bate forte no meu peito, alçando com o olhar um horizonte de esplendor, da liberdade de amar sem prender, de libertar pra viver.
Eu não fiz nada. Só me retirei, porque a gente sempre sabe quando é a hora de sair. Eu saí, com cuidado, você não notou a minha ausência. 
Mas quando meu coração bateu forte, você ouviu de longe, e quando o brilho do meu sorriso irradiou pela estrada, você quis saber porque.
Olhou na sua estante, eu não estava mais ali. Dos amontoados de corações que você coleciona, não havia lugar pra mim.
Eu não nasci pra ser coberta por um véu de poeira. O único véu que vai cobrir minha cabeça um dia, será um branco de renda francesa, o dia que eu entregar meu coração pra alguém que não vai aprisioná-lo nem fazer dele um troféu barato.
Você achou que eu tinha cara de palhaça. Mas quando eu fui embora, foi você quem ficou com o nariz vermelho.
É...Essa menina não é uma boneca. Essa menina é uma mulher.





domingo, 13 de janeiro de 2013

Desabafo sobre iogurtes, bundas e prazeres perecíveis

Isso é uma coisa que me entristece ainda. É como se eu estivesse andando num corredor de um supermercado onde os iogurtes estão com a data de validade ali, no bico, tipo: vence amanhã.
Hoje, não consigo entender essa preferência, esse gosto que as pessoas tem por prazeres perecíveis.
Sei que a palavra prazer e perecível parecem mesmo ter uma correlação, mas eu não acho que elas tenham que caminhar juntas, sabe. Tá, tudo no mundo é perecível, inclusive nós mesmos. Mas tem coisas que são  como iogurte fora da geladeira, azeda mais rápido sabe.
Os relacionamentos estão cada vez mais "iogurtes fora da geladeira". Sim, nesse mundo egoísta que vivemos, parece que a maioria dos relacionamentos tem data de validade, como, "até que meu umbigo nos separe", mas poxa, será que precisa ser absolutamente tão raso?
Dá pra ser um pouco menos superficial? É, eu sei, é mais legal ter uma bunda pra cada dia semana... É mais legal mesmo? Não, mano, para com isso, não é. Não dá pra ser mais legal ter um monte de bundas e nenhum coração, sabe. Não pra sempre!
Tá, fodam-se, eu acredito que existem pessoas no mundo, que claro, pensam em bundas, mas pensam também no que vai ficar quando a minha bunda cair, sabe.
Isso me broxa tanto que as vezes eu tenho vontade de passar o resto da minha vida em celibato moral. É, isso mesmo. Eu me permito recusar seu convite pra sair, o dele e do outro se eu perceber que eu sou apenas mais um prazer perecível na sua vida. Não tô querendo ser falsa moralista, mas cansa você conhecer um monte de gente, sair, conversar e tal, e perceber que, putz, vence amanhã.
Não, eu não quero um pai pros meus filhos agora, nem o amor pra vida eterna, mas eu queria ser mais do que a foto da mina gata, modéstia bem a parte, que você vai mostrar pro retardados dos seus amigos e vai dizer: Peguei.
 Mas, às vezes, eu paro e penso que eu quero ser mais que "semana passada", "ontem" ou " a gente se fala". Não me contento mais com esse monte de migalha que sobra quando a gente corta o pão. Eu quero inteiro, tudo.
"Que atire a primeira pedra quem nunca teve prazeres perecíveis". Sim, caros, todos tivemos, e por vezes temos, mas vai de nós escolhermos se isso será uma constante em nossas vidas. Cabe a nós, decidirmos se vamos trocar blocos sólidos de concretos por miseráveis castelos de areia que vão ruir na primeira marola mais abusada que vier.
A vida não é um eterno rala e rola, sabe.
Não me acho melhor que ninguém pra ficar cagando regra de como as pessoas devem agir, de como é melhor ser, quem é o cara ideal pra mim. Se eu soubesse, não tava aqui, pensando sobre tudo isso.
Eu só tô com o saco (que eu não tenho) na lua de ficar comprando iogurte que vai vencer amanhã!!! Eu posso querer que meu iogurte dure mais? É crime eu me apaixonar e pedir, Deus, quero um iogurte pra vida inteira? Posso pedir: fabricantes, estendam o meu prazer de ter um iogurte que vá me fazer feliz hoje, amanhã e quem sabe até o fim dos meus dias?
Será tão impossível, tão árduo, a gente encontrar um coração assim, que acelere o nosso, acelere por nós, que queira estar junto, que não dê prioridade pra tudo aquilo que está condenado ao lixo no dia seguinte? Não. Não é possível que seja assim. Eu me recuso a acreditar nisso.
O tempo passa, hoje a gente tem 20, amanhã 30, 40, 50 e quando for ver, passou a vida comendo iogurte vencido, sem nada no coração pra alimentar a alma, sem nada mais sólido pra construir uma vida mais feliz do que essa escrotidão azeda que a gente viveu por tanto tempo.
Amigos, bundas caem, iogurtes azedam e a vida passa.